quarta-feira, 19 de agosto de 2020

INACREDITÁVEL MAS "POSSÍVEL"

 

INACREDITÁVEL, MAS “POSSÍVEL”

(Crónica “alienada”, para vários “paladares”)

 

Já pressinto que o primeiro impacto desta escrevedura com os meus leitores, face às minhas habituais “parvoíces”, poderá ser: o que é que este desmiolado, desta vez tem para expor. Se essa interrogação, porventura surgir na cabeça de alguns virtuosos em imaginação suculenta, desde já declaro, que concordo com a pertinência da mesma. Não sem antes advogar, que também tenho direito a ter os meus picarôtos de “loucura”.

Enfastiado por este confinamento monástico a que COVID-19 me constrangeu, há raleiras transitórias onde falta a lucidez, libertou um espaço fértil, agra em que crescem e grelam, os mais díspares pensamentos. Muitos sem nexo algum, mas, que eu aproveito para “muscular” o meu discernimento, opinando sobre eles, à semelhança de quem corre esbaforidamente sobre um tapete rolante para ir a nenhures; logo, sem sair do mesmo sítio. Faz bem à saúde mental. Fortalece-a e ao mesmo tempo, alivia tensão cognitiva.

Pois há instantes pus-me a cismar sobre um dialogante palratório de circunstância fantasiosa, que tive com um fulano virtual meu “conhecido”, mas mais desaparafusado do que eu, a respeito da intercomunicação trans-global com recurso às redes sociais, que “resolvem” quase tudo nas aspirações lunáticas daqueles que, isentos de quaisquer fronteiras de desconfiança, interiorizam a virtualidade como sendo uma realidade.

Principalmente no poço facebookiano sem fundo e sem horizontes definidos, “vomitam” tudo o que lhes vai no ânimo a afrontar-lhes o caco. Desde descargas nervosas, diarreias de ódio latentes, lamentos de afectos não correspondidos, insultos azêdos, folclóricos, ridículos ou descabidos, queixumes despropositados, paixões suspirantes assolapadas, desabafos de privacidade, (que pode ser prejudicial), estados de espírito no momento, o que estiveram a manducar, os sítios onde estão ou por onde passaram, e até, sorrisos enjambrados por medida para agasalhar com ligeira fugacidade, o que lhes suplicia a âmago e lhes pode antecipar o óbito do tempo emocional, etc.

Perante as perturbações provocadas por esta “pandemia” comunicacional, - profectizava ele - não ponho de parte que “muitos” manêgos acreditem, e até, avalizem, que é possível conceber progenitura à distância, a partir qualquer parte do globo.

É verdade. Ele, com acentuado sarcasmo mascarado com um sorriso trocista, disse isso. Eu ouvi aquela palermice e comecei de imediato, como um varrido doidivanas, a pensar para com os meus botões. São daquelas “realidades” aparentes que não cabem na cabeça de ninguém, mas têm lugar na minha; é por isso que vou aqui tentar debulhar rapidamente o assunto, para arrolhar a curiosidade sôfrega dos meus ledores, em face desta minha asserção sobre a virtualidade poder creditada como uma realidade. É verdade!

Então, andemos. A qualquer “crente” usuário fanático das redes sociais, neste caso, seguramente a sofrer de miopia cerebral, pode ser facultada a fazedura de um descendente, à mais avantajada distância quilométrica.

Eis como deve proceder, caso se encontre distante da “sócia” e a vontade lhe aflore à mente: chegado à sua habitação temporária, fatigado da labuta ou de aturar um chefe maluco, incompetente mas convencido, (hoje há muitos) e após tomar um bom duche para refrescar e afinar as ideias, deve refastelar-se confortavelmente, quando a vida lho permite, e, com calma angelical, e vá tragando uma bebida espirituosa, enquanto medita sobre a questão e espera que a coragem abrolhe; após esta alcançar o limiar desejado, efectua uma vídeo-chamada para o vizinho de maior confiança para a cerimónia copulativa, e, com fingida plangência, “roga-lhe” para ele ir lá a casa fazer o serviço em seu nome – decerto, inchado pela fidúcia depositada e por outra coisa, ele irá de boa-vontade. Depois do acto consumado, e o retorno do sucedido comunicado, espera, de cabeça baixa sob o peso “emoção”, pela nascença do pimpôlho/a, a que naturalmente não faltará da sua alegre e curiosa presença, minada por uma profunda ansiedade paternal.  

Decorridas todas estas fases, que levam o seu tempo, após ouvir o primeiro gritinho de heureka para vida, libertado pelo novo ser, se este lhe apresentar quaisquer singularidades cromáticas ou nas aparências físicas, que o façam “desconfiar” não ser sua a criação, manda proceder a um teste de paternidade, (hoje é possível) através do código de ADN, cuja precisão está estabelecida em 99%, sendo que, a incerteza no 1%, é para as quebras – em tempos idos, houve muitos pais de filhos dos outros, que não tiverem esta chance.

Em função dos resultados cientificamente obtidos, fica esclarecido do que já há muito devia ter conhecimento da distinção entre a realidade e a virtualidade.

É simples, não é? Inacreditável, mas “possível”. (?!).

Acho que meu “conhecido” tem razão.

 

António Figueiredo e Silva

Coimbra, 19/08/2020

 

http://antoniofsilva.blogspot.com/

 

Nota:

Procuro não fazer uso do AO90

 

 

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

TECNOLOGIA AERONÁUTICA

 

A TECNOLOGIA AERONÁUTICA

 

Desde que o homem pensou em voar, começando na mitologia grega com a figura de Ícaro, o constructor de umas asas feitas de penas coladas a cerume, que, - pensava – lhe garantiriam, voando, a sua fuga de Creta - voou tão alto que o calor do astro-rei lhe derreteu a cera, vindo ele a cair e perecer nas águas do Mar Egeu – até ao grande Leonardo da Vinci que fantasiou e esboçou o seu hornitóptero, passando ao padre Bartolomeu de Gusmão, que idealizou e desenhou uma “máquina voadora” - cujo sonho nunca se materializou - a que chamou de Passarola, até ao francês Alberto Santos Dumont, considerado o pai da aviação, e os americanos irmãos Wright (aqui existe uma polémica, sobre quem foram os primeiros a elevar-se no ar, dentro de uma máquina voadora traccionada por um motor). O sonho do Homem era voar.

A determinação de cavalgar nos céus, tem-no forçado afincadamente a puxar pelos seus neurónios e fazer uso da heurística e da hermenêutica, com vista a descobrir, estudar e aperfeiçoar os materiais usados na construção aeronáutica, que devem primar pela leveza, flexibilidade e dureza.

Em princípio começaram a ser usadas estruturas de madeira, (balsa), cobertas de tela de linho; depois, armações híbridas, combinadas com madeira e alumínio e tela; posteriormente alumínio ensanduichado, titulado dural (duro alumínio), que era mais resistente, leve e flexível.

Porém, à medida que a ciência investigatória foi progredindo, assim o estudo da constituição molecular dos materiais a aplicar foi evoluindo, e novas estruturas moleculares foram criadas, para resistirem às forças de tracção, compressão e torção, a que uma aeronave está sujeita, com vista a resistir à fadiga do material, um dos principais inimigos da construcção aeronáutica, decorrentes da sua sujeição a vibrações, seguido da oxidação, alguma provocada pela da circulação de correntes estáticas geradas pela fricção do ar e também pela variação de temperaturas a que estes materiais são sujeitos, que não excluem a promoção da oxidação galvânica, uma vez que os constituintes metálicos de uma a estuctura, não têm a mesma composição, geram entre si diferenças de potencial eléctrico, que originam a circulação micro-correntes, que gradativamente vão transformando os metais em óxidos metálicos, afectando as suas características primárias, constituindo deste modo, riscos para a segurança estructural.

As variações de temperatura têm um grande efeito na causa da fadiga do material, porque provocam contracções e dilatações que se repercutem muito abaixo do nível molecular, e afectam, a chamada, *força de interacção forte, que é a força que mantém a estabilidade e a coesão nuclear nos átomos de um material, fragilizando deste modo a sua estrutura compactante. É daqui que resulta grande parte da tal fraqueza do físico metálico, o “papão” que mais dores de cabeça tem provocado nos estudos científicos e nos cálculos matemáticos para que a construcção de aeronaves e seus derivados, seja uma realidade na segurança que hoje podemos constatar.

Um dos metais habitualmente utilizados nos aparelhos de voo, é o titânio. Devido à sua resistência ao trabalho, às variações térmicas e de tensão, e pela sua densidade, granjearam uma aplicação bastante activa na aeronáutica – se bem que, mais pesado do que o alumínio, está determinado também, que é duas vezes mais resistente.

Após titãnica (não tem nada a ver com o titânio) contenda, os experts nesta matéria, conceberam os materiais compósitos, que vieram, não digo debelar, todavia, atenuar-lhes parte das dores de cabeça. Foram criadas as fibras de carbono. São de elevada resistência à fadiga, ultraleves e de extraordinária flexibilidade - particularidades que têm conquistado a construção de tudo aquilo que voa, e não só.

Actualmente existem aeronaves, em que a totalidade da sua fuselagem e toda a parte alar, são fabricadas com essas ditas fibras de carbono.

A aeronáutica é um mundo à parte de tudo. É um universo onde criatividade e invenção se completam e germinam, mas que a maioria das pessoas desconhece – até eu.

A primeira vez que ouvi falar e depois constatei, o que eram ondas ultrassónicas, foi na aeronáutica. Era um dos métodos de detecção de fracturas ou defeitos internos, em acessórios destinados construção de aviões. Actualmente, qualquer pessoa sabe o que é uma ecografia.

A primeira vez que utilizei um aparelho chamado boroscópio, foi para detectar possíveis defeitos nas alhêtas das turbinas dos reacatores dos Boeing 737. Agora, quase toda a gente sabe o que é uma endoscopia ou uma retossigmoidoscopia.

A aplicação de fibras ópticas aplicadas na aeronáutica, foram depois direccionadas para os caminhos da medicina convencional.

Presentemente, no fabrico automóvel, vem embutida muita tecnologia “importada” da aviação.

As centralinas – que são o cérebro das viaturas e do funcionamento das máquinas térmicas que as tracionam; medidores-de-massa-de-ar, turbo-compressores, sensores magnéticos, que vieram substituir vários modos de ligação ou interrupção eléctricos, cervo-freios e sistemas anti-derrapagem nos circuitos de freagem, direcções assistidas, etc.

A tecnologia aeronáutica, esteve e continua, na vanguarda dos sistemas tecnológicos, que primam pela segurança e pelo conforto, sendo parte dela irradiada para outras aplicações, incluindo as relacionadas com a saúde, no que diz respeito a materiais aplicados na cirurgia, imagiologia e outras, que de momento não me vêm à mente. 

Toda esta lengalenga, para quê?

Só para dizer que o A, E, I, O, U, que me concedeu os conhecimentos que me permitiram “voar” no hermetismo intricado do universo da tecnologia aeronáutica, foram, digo-o com orgulho, adquiridos na FORÇA AÉREA PORTUGUESA e complementados com todo o trajecto que me propus a seguir, graças a várias matérias que a minha obstinação e curiosidade natas me levaram a estudar com sustentada dedicação e inflexível entusiasmo.

Não posso também esquecer a DETA Linhas Aéreas de Moçambique - naquele tempo meu porto de abrigo - a Air Rhodesia em Salisbury, Rodésia, a TAP Transportes Aéreos Portugueses, (agora moribunda), em lisboa, Portugal) e a Fields Aviation, em Germiston, África do Sul.

A todas estas “escolas”, que naquela altura, através dos seus Centros de Formação Teórica e nos hangares, (prática), muito contribuíram para clivagem da minha formação tecnológica e para a acumulação de conhecimentos, que ainda hoje me permitem debater sobre a técnica aeronáutica, fiquei eternamente grato.

E, para rematar, acrescento: um Técnico da Aviação, não se faz com trinta horas de voo agarrado ao manche de um “papagaio”. Para ele, nem trinta anos a “mexer em parafusos, a torcer arames, a esticar cabos e fios eléctricos, ou a bulir em circuitos transistorizados”, são suficientes para atingir a perfeição absoluta. Para isso, é imprescindível acompanhar a desenvolvimento. A evolução está sempre presente, e, aquele ambiciona saber, não tem só de ler; tem de estudar e ampliar a profundidade dos seus conhecimentos a outras áreas da física, (Newtoniana), e até áreas da química. Não somente para memorizar, porém, para compreender.

Apesar da evolução da aeronáutica constituir uma proeza sem precedentes da invenção do Homem para realizar o seu sonho de voar, e ele se apetrechar de todos os cuidados e das mais sofisticadas tecnologias para esse efeito, o limite do perigo voa paralelamente à máquina, como o risco (red line) nos acompanha em todos os momentos da nossa existência.

Contudo, devo dizer que as aeronaves são seguras – quando inspeccionadas, reexaminadas, verificadas, corrigidas e testadas, com erudição e entendimento.

 

António Figueiredo e Silva

Coimbra, 16/08/2020

 

http://antoniofsilva.blogspot.com/

 

Nota:

Procuro não fazer uso do AO90

sábado, 15 de agosto de 2020

“TUBEIRA DE REACÇÃO” “REACTION TUBE” "REAKTIONSROHR" “REAKSIE TUBE”

 

“TUBEIRA DE REACÇÃO”

“REACTION TUBE”

"REAKTIONSROHR"

“REAKSIE TUBE”

 (DETA Linhas Aéreas de Moçambique)

(DETA Mozambique Airlines)

(DETA Airlines van Mosambiek)

 

Estou cansado da presumida exposição de farpelas “estéticas”, corpos talhados a cinzel de sublimada aparência, guarnecidos de sorrisos de deleite previamente montados para uma captação rigorosa a reservar para um futuro que com celeridade se aproximava e onde agora, toda essa beleza se desvaneceu. A osteo-oxidação da vetustez tomou conta de tudo isso, deixando apenas a saudade e a lembrança de tempos, que o próprio tempo há devorado.


Surgiram os grandes aeroportos, onde antes eram cerradas florestas capilares; algum do “arvoredo” que ainda possa existir, é ralo e alvo, como flocos de neve a caírem na manhã do inverno da vida; as rugas, impertinentes, sulcam a epiderme, apostadas em não deixarem as maquilhagens e os pozinhos de perlimpimpim, entrarem em greve; as cintas, apertadas como cilhas de burro, procuram esconder as panças dilatadas, outrora componentes de esculturais físicos, montados sobre um par de pernas aparentemente bem torneadas – algumas – e engrinaldados retesados bustos, que, só de olhar, a bomba hidráulica do sistema vascular andava muito perto de entrar em cavitação; as banhas assenhoraram-se da formusura e o andar já se acentua de ligeira claudicação – em algumas/uns.

E sinto-me fatigado, porquê? Porque não foi somente àqueles que envergaram essas fardetas agarrados aos “comandos dos pássaros-de-ferro”, a esses outrora corpos “esbeltos”, especialistas em equilibrar e manipular tabuleiros repletos de sandes ou recipientes com chá, café ou laranjada nem aos outros, “comandantes” de carga e recepcionistas de terra, que o nome de DETA Linhas Aéreas de Moçambique, se propagou por todo o território e além-fronteiras!?

Não. Por detrás de todo esse emaranhado de elementos “presunçosos”, bamboleavam as batas brancas, dos “médicos” e “veterinários” da aeronáutica, que asseguravam com cuidado e milimétrica precisão, o bom funcionamento das máquinas voadoras, para que tudo corresse bem. Eram eles que, formando coesas e organizadas equipas, perdiam muitas noites em investigação para a resolução de avarias, com o objectivo de que a toda a tripulação e passageiros, pudessem ser garantidos o máximo conforto e segurança nos voos internos ou internacionais.

Eram técnicos em aviónica, técnicos de manutenção com cursos de habilitação aos diversos aviões, especialistas em acessórios, hélices, casquinheiros, etc.

Foi também e principalmente, graças a esse pessoal, quase sempre remetido para o anonimato, que a DETA Linhas Aéreas de Moçambique, sulcou parte dos céus do nosso globo e creditou a sua confiança nas pessoas que as utilizaram para chegarem aos seus destinos em segurança.

Lamento, mas vou ter de abrir as outflow valves, porque a pressão de cabine, está a sair fora dos limites.

Desses não existe “faladura”. Devem cheirar a skydrol.

 

António Figueiredo e Silva

 

Técnico de Manutenção de Aviões da DETA

Lincença Aeronáutica nº 122

Especializado em:

- Fokker F-27 Fiendship

- Boeing 737

 

Com os Cursos complementares tirados na TAP, dos aviões:

- Boeing 707

- Boeing 747 (Jumbo)

 

Fui chefe de equipa em:

Fields Aviation

Rand Airport

Germiston – Zuid Africa

  

Coimbra, 15/08/2020

 

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Obs:

Faço por não usar o AO90

sexta-feira, 14 de agosto de 2020

APARÊNCIAS


 

Não vivas de aparências, elas mudam.

Não vivas de mentiras, elas são descobertas.

Não vivas pelos outros, vive por ti.

(Autor desconhecido)

 

 AS APARÊNCIAS

 

Pois é. Afinal, se calhar não é!? Até poderá ser, mas, bem vistas as coisas, vivemos num mundo balofo onde as aparências conquistam o primeiro lugar no podium social. Por isso, nem tudo o que parece é.

A meu ver as aparências não passam de ornamentos toscos e tolos, que só brilham na ausência da eloquência, o espaço reservado à modéstia, à simplicidade e à integridade. As lantejoulas servem meramente de disfarce a quimeras que esvoaçam do reduzido espaço de mentes entorpecidas pela penumbra da ilusão, como se estas fossem uma realidade.

No entanto, há uma particularidade que as híbridas afigurações não conseguem encobrir; o carácter. Porque este já vem patenteado geneticamente e é sempre fiel a cada criatura, desde a sua germinação até que ela suba a outra dimensão. Na rectidão, a Natureza não é desperdiçada e mantém e mantém com apurada precisão a imutabilidade na formação das Suas obras. Quer queiramos quer não, as coisas funcionam desta maneira e não há outra volta a dar.

É por isso que, viver uma vida de aparências, é andarilhar uma existência a enganar-se a si próprio. É um trabalho de tal dureza que pode levar à capitulação emocional, à depressão e ao desespero. Isto porque, as aparências realmente podem enganar, porém, com o atravessar do tempo, o odre de contenção vai-se rompendo e deixa escapar as atitudes mais imperceptíveis, que são sempre as mais fiáveis reveladoras do que cada criatura guarda dentro de si. Por isso, aqueles que querem mostrar o que não são, acabam por expor, boa ou defeituosa, a medula da realidade que as caracteriza.

Aqueles que abandonam a sua essência exclusiva para se alicerçar nas aparências são semelhantes a astros informes, porque não desfrutam de brilho próprio. A falsa imagem, não passa de um embuço onde muitos tentam encobrir o seu verdadeiro interior, esquecendo-se de que, como ocorre com o azeite e a água, mesmo depois de caldeados, com o tempo, um deles afunda.

Sei que esta é uma metáfora atabalhoada e sem piada alguma, mas encerra uma realidade bastante cimentada nos nossos dias. As aparências.

Não deixa de não ser verdade que iludem. Mas as aparências do seu efeito são sempre de curta duração. Assim, as pessoas devem primar pela sua legitimidade para que amanhã não venham a sofrer de desilusão e terem de cair na fossa da zombaria “silenciosa”, porém mordaz e tendenciosa. Não é no aspecto, no “ouro”, nem nas lentejoulas, que reside o verdadeiro carácter do ser humano; este habita na verdadeira essência da criatura, que é aferida pelo seu comportamento. Os seus procedimentos é que são o real garante da destruição das aparências, caso existam. Como tal, viver de aparências será sempre uma rasteira que os fracos de espírito armam a eles próprios; criam amigos que nunca o foram, afectos que nunca existiram, e até, quem é o mais grave, expectativas falsas, que um dia lhes irão custar caro.

Não deixo de não dizer que para sobreviver nesta comunidade tribal, torna-se necessário o recurso às aparências, porém, quando acima de determinado patamar, pode sobrevir moléstia viral. A obsessão.

Contudo e em princípio, elas enfeitiçam somente aqueles, cuja perspicácia está enfraquecida, é incompleta ou inexistente, e lhes obstrui a visão do horizonte onde se situa a realidade.

É certo que as aparências andam infalivelmente grudadas ao fingimento, como se fossem irmãs siamesas, embora heterozigóticas.  Umas não sobrevivem sem a outra, porque, enquanto as primeiras aparentam o que não são, a outra, dissimuladamente finge acreditar no embuste. Compreendo, no entanto, que o “jogo-às-escondidas” entre estes dois elementos, são uma maneira desequilibrada de tentar harmonizar, com recurso ao fingimento, a simetria na classe social numa comunidade doentiamente avassalada pela presunção. Até nem me parece estar de todo, errado!? São habilidades airosas da interacção entre a pavoneio barato e o fingimento intencional, os condimentos indispensáveis para estas caldeiradas de aparências.

Para terminar, questiono, qual a razão de subsistirem seres que não conseguem edificar a sua existência com pedras de realidade arrancadas na pedreira do seu próprio eu? Penso, e devo manifestá-lo, que as razões principais do recurso às aparências devem ser decorrentes da fragilidade nas componentes coragem, auto-determinação e falta de conhecimento próprio. Rematando: ignorância congénita.

É certo que ninguém se faz. Já nasce feito. Reconheço que a sociedade tem parte interveniente em algumas mudanças no comportamento das pessoas. Mas o cerne genético é imutável.

Assim, sou levado a plagiar algumas palavras que fazem parte de uma antologia de adágios, agrupados pelo músico brasileiro Júlio Cézar Leonardi: “quem nasceu lagartixa, nunca chega a jacaré”.

Pode não ser, mas parece. Se calhar, é mesmo.

 

António Figueiredo e Silva

Coimbra, 12/08/2020

 

http://antoniofsilva.blogspot.com/

 

Nota:

Procuro não usar o AO90.