terça-feira, 30 de março de 2021

ESTOU FARTO DELA!

 

ESTOU FARTO DELA!

(Uma “estória de amor platónico”)

 

          Mas é que estou mesmo!?

Sinto grande dificuldade em suportar a pressão psicológica a que ela me pretende sujeitar.

É chata e entediante p’ra burro! Quando me apetece deslocar para qualquer lado, sou obrigado, mas a contragosto, por uma questão de compromisso legítimo, a gramar a sua companhia, que, apesar do pouco “cartuxo” que lhe dispenso, ela não me larga. Sempre colada a mim como um carrapato, quase não me deixa respirar, obrigando-me, com uma tensa força elástica a beijá-la, mesmo contra a minha vontade. A demonstração do seu amor é tão grande que quase não me deixa respirar.

Nunca transmite nada. É deveras exasperante e ao mesmo tempo opressivo o silêncio da sua companhia. Isto leva-me a ter ideias e sensações onde a claustrofobia se manifestam.

Posso falar com amorosa meiguice ou barafustar como um louco, que dela não sai um único pio de reconhecimento ou reprovação. Faz de conta que estou a falar para uma parede.

Com uma serenidade que lhe é distinta e somente para me enfadar, por vezes em maneira de gozo, ainda me atira uns chapadões hidrosféricos, que me acertam nos óculos só para ver se me perturbar a visão. Vingança? Talvez. Mas careço da sua companhia, e como tal, limito-me a “comer e a calar”. E ela, “nem chus, nem mus”. E assim vamos dando as nossas passeatas imbuídas num falso romantismo amoroso, até à primeira oportunidade que surja para a poder afastar de mim por algumas horas. Aí surge um alívio indescritível, como se me tivessem desamarrado um colete de forças. Ah! – Suspiro! Após haver inalado sem constrangimento, umas golfadas de ar “puro”. Aaah! Como é linda e valiosa a liberdade, depois de um período, ainda que pequeno, sob o seu condicionamento!  

Mas, “voltando à vaca-fria”, ela teimosa como o raio-que-a parta. Estou mesmo fartinho.   

Muito tenho pensado em divorciar-me, mas as circunstâncias da vida não me têm permitido ter essa oportunidade, porque fui obrigado a “casar“ com ela; aguentá-la até ao resto dos meus dias, com o sacrifício da minha liberdade pessoal, e com total submissão à sua impertinente teimosia; sustentando o carrego de todos os seus desmandos e birras, grudados à constituição física que lhe confirmam a realidade palpável, que, apesar de amorfa, tacitamente diz tudo. Diz muito! Fala muito e muito alto, no silêncio do seu corpo fibroso, com alguns “microns” de intervalo entre os filamentos que lhe dão forma.

Mas compreendo que não devo prescindir da sua companhia, que, apesar de “mortificadora”, me confere alguma protecção.

Para as pessoas que possam possuir “conceitos perversos”, quero afiançar-lhe que…

ESTOU MESMO FARTINHO DA MÁSCARA!

 

António Figueiredo e Silva

Coimbra, 30/03/2021

 

 

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