quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

A ESTUPIDEZ



A ESTUPIDEZ*
(Ensaio sobre esta doença congénita)


Para quem tem dois dedos de testa, frequentemente se interroga sobre se o estúpido nasce assim ou se é estúpido porque quer.
Eu penso que a estupidez é de origem genética, porque consiste numa deformação do intelecto e até pode ser considerada como endemia incurável, uma vez que não existem registos de regressão; contudo, é sabido que ela progride com o avanço etário, tendo como única terapia a tumba.
Para um estúpido, por muitas lições que lhe queiramos dar, não a melhor mas a única, é deixar que ele bata com a cabeça na parede!... Mesmo assim, com alguma mágoa acabamos por constatar que ele continua estupidamente fiel às suas convicções, sacralizando as parvoíces delas decorrentes com a mais alta estima e parva consideração.
Reparemos nisto: quem consegue conversar, conviver, ou resolver algum problema com um estúpido?... É muito difícil, a menos que seja outro estúpido como ele ou com a hibridez de uma mula. Ainda há muitos!
Não é difícil conversarmos com um ignorante ou até mesmo moldá-lo numa pessoa de bem e respeitador dos valores da ética; mas com um estúpido isso raramente ou nunca acontece. O estúpido é calhau que não fragmenta aos golpes da marreta da razão. É requintado na velhacaria e na delação, não é propenso ao diálogo, é agressivo e teimoso até levar na “cornadura”, e, por norma tem - se calhar nem tem - a mania que é o maior e que todos lhe devem prestar vassalagem. Ora, esta situação até parece um paradoxo porque, não cabendo isto na cabeça de uma pessoa normal, tem no entanto espaço mais que suficiente no cérebro arenoso e árido do estúpido.
A diferença entre o ignorante e o estúpido, ainda que não aparente, é abissal; porque um, ainda que pouco, diz aquilo que sabe e pode apresentar uma versatilidade que lhe permite absorver os ensinamentos, mas o outro, o estúpido, verborreia sobre o que julga saber, com grandes probabilidades de não saber nada, e ainda sobre aquilo que desconhece. Por preceito, a estupidez é sempre acompanhada da ignorância, enquanto que a ignorância não tem necessariamente de conter estupidez. A estupidez, apesar de aparentar descontracção, funciona como um tampão ao conhecimento, sendo essa a razão porque deve ser muito triste ser-se estúpido.
As atitudes e as conversas do estúpido são tão estupidificantes como ele próprio, sendo por isso um ser irritante e cheio de limitações, que devido à sua estupidez ele nunca reconhece. É um ser com o qual não devemos perder o nosso tempo ou alimentar polémicas, para não corrermos o risco de sermos contaminados pela sua doença.
Dificilmente um estúpido tem amigos, a não ser que sejam tão ou mais estúpidos do que ele, porque de outra maneira está só. Pode ser até um “pária” endinheirado, dono de um império, com um bom carro, ou mesmo um carrinho de mão, um parvo com “dê erre” sem ter direito a isso, ou um simples lavrador ou “industrial” cavalar; quando minado pela estupidez, não é nada!... Não passam de desprezíveis imbecis, subsistindo porém uma pequena diferença entre eles; se têm dinheiro compram os “amigos” que um dia, mais tarde ou mais cedo os hão-de trair levando-os ao cadafalso, começando por lhe cortar na casaca; se são uns pobretanas, ninguém está para os aturar e são mandados apanhar búzios
A estupidez torna as pessoas maquiavélicas, implicativas, agressivas e brutas, isto é, até encontrarem um “bruto” que não seja estúpido como eles e se proponha a apertar o cabresto com uma tensão apropriada que os faça refrear essa estupidez.
O estúpido constrói à sua volta castelos de tijolos estupidificados de poder, que por falta de bases sólidas um dia lhe vão ruir em cima!... E ele, com cara de palonço e ao mesmo tempo de vítima, comprimido debaixo dos destroços da sua débil “construção” regouga para si: como pude ser tão estúpido?!... Já vi que a estupidez não compensa! Mas se nasci assim, que hei-de eu fazer?!...
O problema é que quando ele pensa o que nunca pensou, já é tarde de mais.
Costumo dizer que a estupidez é a espondilose espiritual, sendo como tal um dos piores infortúnios de quem a tem.

António Figueiredo e Silva

Coimbra


* Este ensaio é dedicado a todos os estúpidos
que eu conheço e aos que desconheço mas
que sei existirem, no sentido de os ajudar
 a pensar, se ainda forem a tempo, e deixarem
de poluir a coesão da harmonia social.

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