sábado, 12 de junho de 2021

A TENDÊNCIA JUSTIFICA O DESLEIXO

 

 A moda, afinal, não passa de uma epidemia induzida.

(George Bernard Shaw)

 

A TENDÊNCIA JUSTIFICA O DESLEIXO

(Pilhéria criada para censurar alguma “chavasquice”)

 


Moda é moda, caramba!

É verdade.

Às tantas foi mudança de maré influenciada pela lua, sei lá!?

Passou-me pela tineta, “santificar” uns dias ao desleixo, p´ra ver se ouvia o ruído da barba a medrar. Então optei por imitar muitos deputados, apresentadores televisivos, e outros exemplares das nossas “aristocráticas” varas porcinas, votados ao desmazelo, com a escusa de que é tendência - ainda que achavascado e piroso, não deixa de não ser respeitado (e conotado, a meu ver), como sinónimo de badalhoquice.

Actualmente, verifico que a tendência “talibânica” estrou na berra em Portugal.

Confirmei, entretanto, que a minha determinação, de curta metragem temporária, nesse sentido, até me trouxe alguns frutos proveitosos. Além de outros, por mim considerados de menor importância, quero salientar com particular interesse, o estado comportamental de alguns seres, que, sendo, nem parecem que o são. Não direi imigrados do paleolítico, contudo do neolítico, a ver pelo seu comportamento e figura, no tempo em que a pedra polida era rainha.

Então, deixei agraudar a barba por uns dias, enfiei um velho chapéu a cobrir o “piso” do “heliporto” que protege a minha massa racional para que os infravermelhos do astro-rei não me aferventassem os miolos, vesti umas calças de ganga desgastadas - o preço das esfarrapadas, está pela hora da morte - protegi o meu cabedal com o casaquito puído, enfiei umas apalhaçadas sapatilhas com dois ou três buracos de respiração, nesciamente “embelezadas” com umas enormes e anedóticas linguetas – como manda a “sapatilha” - e fui sarandilhar pelas velhinhas ruelas, becos e recantos da baixa conimbricense, apostado em observar o comportamento do Zé Pagode em relação à minha triste figura - para mim, tida  como anedótica e descuidada. Mas estava dentro das tendências da modernice.

Os andantes que comigo cruzavam, olhava-me de soslaio, manifestamente com legitimada repugnância e outros com sublinhada comiseração; talvez idêntica à daquelas pessoas asseadas, quando vêm “criaturas” semelhantes a ouriços cacheiros, nas redes de comunicação visual, e em outros lugares de relevo, onde aparecem esses desalinhados “gordurentos”, de barba por aparar e as guedelhas, muitas vezes resumidas três pelos desgrenhados e untados com brilhantina ou repletos “serradura”, pertencentes à mais pura nata da modernice, onde a incúria se faz notar – mas é moda, porra! Maneiras que em outros tempos, quando eu era moço, apenas eram características atribuídas aos palhaços circenses e aos objectivamente necessitados, p’ra quem a vida na realidade não sorria.

Sei é que de vez em quando, aparecia alguém de olhar bondoso, que, após revolver a bolsa ou os bolsos, talvez com mais cotão do que “cacau”, de onde um braço se esticava na minha direcção com uma moedita entalada entre o polegar e o indicador, que eu solenemente aceitava e “pagava” com modesta gratulação; não porque disso tivesse necessidade, porém, para aliviar a consciência de quem ma havia ofertado, talvez para indulgenciar o peso de algum “pecadelho” que pense haver cometido - coisas da vida! Analisando desta forma as diversas maneiras de ser e de agir, dos desiguais elementos que integram nossa sociedade, face às ocorrências miseráveis que se lhes deparam.

Pude observar, que para uma mesma coisa, as reacções são distintas, bem assim como as expressões faciais. Estas, não eram só exibidas sob um ar de repugnância, desprezo, desconfiança, frieza e rigidez, mas também perante um manto de complacente tolerância, dó, conciliabilidade, respeito e bem-querer.

Eu só pensava; que mundo tão esquisito e variado!

Já perto do meio-dia, com os pés a reclamarem descanso, dei por terminada a minha andança; não direi com os bolsos atabicados, porém, com algumas moeditas, que seriam suficientes para uma frugal refeição. 

Meditabundo, ambulei “meia dúzia de passos” e logo encontrei o destino a dar para os patacos que havia recolhido.

Encostado a um cunhal, apesar do seu semblante desgostoso, mas que ainda reflectia uma réstia de alento na esperança de um consolo, deparei com o primeiro desafortunado, com quem alijei a “carga monetária” granjeada e mais algum, limitando-me apenas a ficar com as lições de vida, que no fragmento de uma manhã, acabei de usufruir.

Então conclui o verdadeiro significado da frase, “Nem só de pão vive o Homem”. Os ensinamentos, têm uma função principal no seu comportamento cívico, onde não só a moral está em causa, como também a sua salubridade física e intelectual.

Paradoxal, contudo, verdadeiro! Por vezes vale a pena andar na moda, mesmo que esta revele desleixo, e se a robustez da palermice aguentar a crítica.

Bem ou mal, já fiz a minha parte; agora, vou aparar a barba e tomar um duche (cantando!), com a convicção de que ninguém irá bater palmas.

 

António Figueiredo e Silva

Coimbra,12/06/2021

 

http://antoniofsilva.blogspot.com/

 

Nota:

Opto por não fazer prática do AO90.

   

 

 

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