domingo, 4 de dezembro de 2016

A AMIZADE







Não são as coisas bonitas que marcam as
 nossas vidas, mas sim, as pessoas que
têm o dom de não serem esquecidas.
(?)

 A AMIZADE
(Reflexão)

Quando me afasto de tudo o que me rodeia e começo a confrontar e a escabulhar entendimentos que há muito tempo se hospedam na minha venêta, inúmeras vezes  arribo a conclusões que vale a pena transpor para palavras, por fazerem parte da realidade dos nossos dias, onde os interesses por vezes conseguem escamotear amizades incertas, substituindo-as por um manto de falsidade bem disfarçada, que aspira, com muito requinte, mostrar uma realidade ainda que aparente, de uma realidade latente, bem dissemelhante da primeira.
A amizade não é mais do que a identificação de sensibilidade em relação aos infortúnios dos nossos semelhantes. Como verdadeira virtude, não é fácil de encontrar, porém não é de todo impossível.
Reconhecer estas pedras no plaino caminho do nosso convívio quotidiano não é por certo tarefa simples, mas se tivermos nascido com agudeza no entendimento de observação entalhado no nosso ser, e durante a “curta” estadia por cá o tivermos aprimorado, conseguiremos abrir a Caixa de Pandora profundamente escondida no fundo reservado dos nossos amigos, ou supostos como isso.
O obstáculo principal que se opõe à sua descoberta (a benquerença) é sua a raridade; podemos compará-la a uma agulha perdida nos fardos de palha da hipocrisia constante que a envolve. É precisamente essa falsidade, adornada com um já muito usado, porém robusto capote, concedido pela manha, que na maioria das ocasiões por muito prudentes que tenhamos sido, embarcamos no lodo do erro e ficamos desiludidos porque as nossas supostas certezas se volatilizaram. Eram apenas aparentes! É bem verdade que as aparências iludem por muito que tenhamos a mente aberta, mas… existe sempre um mas… com uma análise cuidada, conseguimos distinguir a toca do “lobo mau”, da do "lobo bom".
Muitos imaginam, erradamente, que essa virtude se encontra no burburinho das festas onde a alegria extravasa – às vezes até em excesso; nas tascas onde os vapores etílicos fazem arreganhar os dentes; nas ocasiões de mais pesar onde guião deve ser carpimento e angústia; em aparvalhadas excursões (algumas) de romagem às amendoeiras em flor ou para fazer um apalpanço à cortiça dos sobreiros alentejanos e olhar com ar de palonço, as varas dos pata-negra freneticamente a tricar bolotas.
Traduzindo por miúdos: não, ela não se encontra a pontapés, nos casamentos, nos baptizados, nos mortórios, nos aniversários, nas tavernas, nas discotecas, etc. Estes são precisamente os eventos onde o fingimento atinge a sua mais alta magnitude, mas todos ficam aparentemente felizes, porque reuniram muitos “amigos”! Outros porque se encontraram com os palitadores de jaquinzinhos fritos afogados com uns copázios de tintol – a mais sincera companhia – entremeando nos intervalos de mastigação, algumas baboseiras manchadas de um picante tosco e por vezes abrutalhado, das quais não se tira qualquer pitada de aprendizagem; para não falar dos que se alardeiam, “tive muitos amigos convidados”, no funeral do Ti Manel havia muita gente e eu também estava lá! Tinha muitos amigos, caramba! Tinha, tinha!?-Digo eu.
Isto são maneiras imprudentes de contabilizar a amizade que no fundo nunca existiu. Permanece sim, é o medo de que o parceiro se ponha a cuspir palavras pouco abonatórias sobre quem não colabora com a falsidade social estilizada no espaço incorpora. Isto é verdade; todo o resto são cantigas.
A amizade, podemos encontrá-la sim, nos momentos mais desafortunados da nossa vida. É nessas alturas que temos necessidade de ter alguém por perto “que nos dê a sua mão”, que nos escute, que nos aconselhe, que nos apoie. É nessas “tenebrosas” ocasiões que nós ficamos realmente a saber onde está a verdadeira amizade, que muitas vezes brota espontaneamente de onde menos esperávamos, enquanto as ditas falsas amizades se acocoram encasuladas no aconchego sua cobardia e mostram-nos desse modo quão falsa era a sua afeição.
Apesar de tudo, tenho uma coisa para dizer, que, pela verdade que confina vale a pena verbalizá-la: quando um invulgar gesto de amizade com toda simplicidade nos faz um “ataque” de surpresa, invariavelmente apossa-se de nós a vontade bravia de teimar e tentar vencer ou ultrapassar os objectivos a que nos tenhamos proposto, porque sabemos que não estamos sozinhos.
Uma virtude a conservar em molho de gratidão:
A AMIZADE.

António Figueiredo e Silva
Coimbra/04/12/2016
www.antoniofsilva.blogspot.com

     



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