segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

A IMPORTÂNCIA DAS PALAVRAS

 

Palavras certas, ditas no momento oportuno,

podem insuflar efeitos “miraculosos” ou perniciosos;

dependendo de quem as declama e do motivo em causa.

(A. Figueiredo e Silva)

 


A IMPORTÂNCIA DAS PALAVRAS

(Átimos da minha “estadia” no Hospital de Santo António - Porto)

 

    No hospital, o último reduto para o qual nos aventuramos na expectativa de minimizar ou cindir enfermidades, em busca de uma saída airosa para dar continuidade à vida - sem saber até quando -, temos momentos de desfalecimento que o pensamento e o sistema nervoso se encarregam de instalar, valendo-se da nossa momentânea prostração mental. Por muita robustez que tenhamos, há momentos em que, por saturação massiva de pensamentos e acontecimentos, ela tremelica. É nesse instante de debilidade, que mais carecemos de auxílio. Não me queixo da falta de sorte. Eu tive-a. 

   Em face disso, digo: há palavras e atitudes que não se olvidam.

Eram 23h45 de 29 de Novembro de 2022.

Estava eu assentado numa poltrona disposta ao lado da cama 320, (o leito a mim demarcado), na Enfermaria de Cirurgia Vascular; pensativo, nervoso e cismático, sem vontade alguma para repousar, como se no meu cérebro a melatonina houvesse falido. Sentia uma indolência e um cepticismo profundos, que deviam andar à revelia a vincar a minha face, sem que eu os pudesse enxergar e travar. Reacções do corpo e da alma.

Alguém mais experiente e atento, divisou o estado depressivo em que me encontrava, e, sorrindo por detrás da “burka”, - através das lentes oculares engastadas em dois aros acastanhados, os seus olhos assim o manifestavam - aproximou-se. Era uma enfermeira, já soberana de um amplo trilho curricular na especialidade.

- O tem o Sr. Figueiredo? O que sente? O Sr. não está bem.

- Enlatado por uma limitada atonia, respondi:

-Tenho andado um bocado à rasca com umas leves dores no peito, e o nervosismo e a angústia que daí resultam impedem-me de dormir. Não sinto sonolência. Ainda ontem me fizeram um electrocardiograma e uma colheita de sangue, pelo mesmo motivo.

Durante uns minutos estivemos a trocar dois dedos de palratório útil, em relação ao meu estado psicológico no momento. Esse diálogo foi o suficiente para aliviar um pouco a tensão psicológica a que impiedosamente me espremia algum sumo que ainda restava no meu ânimo.

Por fim, conservando a mesma simpatia, suavidade e convicção, diz: “alguma coisa que se passe consigo diga-me. Eu estou aqui, e nós ajudamo-lo”. Descanse bem”.

Pois foi das poucas noites que realmente dormi como um Uma verdadeira profissional que jamais esquecerei, e muito menos as suas palavras.

Isto não acaba aqui, porque eu sempre fui um grande devoto e paladino do poder das palavras.

Sejam elas para doutrinar ou para descatequizar, as palavras usufruem do dom de aliviar, aplacar e unir; não obstando, contudo, que não possam trazer no seu ventre o diabólico poder de massacrar, destruir e desvincular.

A força vocabular pode ser tão leve como as nuvens, ou o oposto; ter a energia de uma tormenta. A sua brandura ou agressividade não é subordinada somente às mesmas, mas ao modo como são ditas, à sua musicalidade, à grandeza do bailado gestual que as acompanha, ao momento, ao sujeito que as pronuncia e a quem as recebe. Todas estas condicionantes são algo complexas, porque obedecem, ou mesmo, são reflexos de estados emotivos, aos quais os nossos cinco sentidos estão incapacitados de penetrar, gerando, em certas circunstâncias, juízos de valor errados. Daí, os genocídios, as guerras, e a seguir, a fome.

É bom ter o dom da palavra, quando a aplicação dessa probidade é aproveitada em granjeio do bem. Se aplicada para disseminar o mal, mais vale que a Natureza condene o orador à tartamudez, por colocar o seu “saber” e a imponência da sua gesticulação ao serviço do erro, da instabilidade, e da desordem, particularidades que, alapadas na desgraça do alheio, lhe alimentam a ambição que pulula no insaciável estômago do domínio.

Não foi o caso desta distinta *Enfermeira de Cirurgia Vascular do Hospital de Santo António, no Porto.

A minha memória jamais esquecerá a valia das suas palavras naquele momento, e a sinceridade das mesmas.

Bem-haja.

 

António Figueiredo e Silva

Porto, 11/12/2022

ou

http://antoniofsilva.blogspot.com/

 

Nota:

Faço por não usar o AO90

 

*Não exponho o nome por uma questão de ética.

 Para não criar diferenciações, uma vez que não tenho razões

de queixa de nenhum dos elementos daquele sector.

 Até hoje, todos têm sido fantásticos.

 

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