sábado, 1 de maio de 2021

A "TERCEIRA FASQUIA"

É velhinha, mas talvez possa servir de leccionação a filhos de

muitos pais.

(O escrevinhador)

 

A velhice é uma tirania que proíbe,

sob pena de morte,

todos os prazeres da juventude.

(François La Rochefoucauld)

 

 

A "TERCEIRA FASQUIA”

 

 

Quando se ultrapassa determinada fasquia considerada por muitíssimos leigos como limitadora temporal, entra-se num espaço que é denominado a terceira idade, como se a idade tivesse espaços e interregnos próprios e não seguisse uma linha de “locomoção” sequencial e constante.

Por considerar bastante depreciativo e desprestigiante este título atribuído à velhice, é que me passou pela mioleira escrever meia dúzia de palavras com o fim de agraciar o imbecil em cuja caixa corniana (é mesmo corniana, que não tem nada a ver com córnea), esta palavra teve a sua infeliz criação. A besta ou as bestas de tão genial ideia, espero bem que tenham atingido a idade suficiente para terem sentido no coiro, o cariz caricato que esta palavra encerra para muitos velhinhos que merecem a nossa afeição, se não mais, por aquilo que de bom e útil nos transmitiram.

A terceira idade!… A semântica desta frase parece querer dizer: deixa passar que não presta; já não existem peças para ele; esquece… é chato como a potassa; não ligues, que já não atina. E por fim, um hipócrita senil, coitado!

A vida é como um segmento de recta, que possui um ponta inicial e uma ponta final. Em qualquer das pontas se vê muito, mas não se diz nada: uma é quando se é criança, outra é quando se é velho, porque é comum dizer-se que o velho volta ser criança; mas como criança ele vê muito, só que, não é levado em conceito.

A nossa sociedade está tão podre, que a velhice já não é tratada com o devido apreço, por falta de formação cívica, que os dos pais dos mais novos não lhes souberam ou não se preocuparam em lhes inocular.

Não existem asilos, casas de repouso, centros sociais ou passes de transporte mais baratos para velhinhos; é tudo para a terceira idade.

A palavra velhice, deixou de ter graça e foi riscada do nosso vocabulário. Contudo, quando é aplicada, a sua entoação de carinho e apreço, morreu à nascença do gesto. Ó velho, chega-te p’ra lá! Velho filha-da-puta - esta eu ouvi. Olha para aquele velho ranhoso!… Já viste esse velhote com o pingo no nariz? Buzina a esse velho p’ra ver se está a dormir. Olh’ó cabrão do velho?! Ó pá, já deves pertencer à terceira idade.

É mais ou menos com esta “altivez” e arrogância que os velhinhos são tratados por uma maioria adolescente de hoje, por estes olvidarem que, com um pouco de sorte ou de azar, serão os velhos de amanhã. Serão tudo o que eles disseram, no futuro que os espera, mais veloz do que pensam.

Imbecilmente... à futura terceira idade.

 

 

 

António Figueiredo e Silva

Coimbra

 

Coimbra, 22/02/2003

http://antoniofsilva.blogspot.com/

 

 

 

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