“A cidadania sacia-se na própria fonte onde
o povo mitiga
a sêde de saber, de cultuar a própria
história
e
de honrar os seus heróis”.
(Reinaldo Ribeiro)
O CABOUQUEIRO
Carta ao meu amigo Zé (XI)
Ao tempo que não te dou notícias minhas, já sei que pensaste que me havia dado o berimbau. Para teu contentamento, devo dizer-te que ainda não, e a prova evidente é que sou eu mesmo que estou a escrever esta epístola e estou ciente de que mantenho a minha peculiar pancada.
Então
e tu, como tens andado? Espero que bem. Também és um safardana dos diabos;
nunca dizes nada. Se não for eu a fazê-lo, chapéu!? Bem, já sei que és de
poucas falas, e eu também só me lembro de ti, quando sinto carência em
descompactar a minha flatulência emotiva.
-
Lá vem este gajo com as suas peculiares boboseiras – dizes tu; desta vez que
nova tempestade virá?! Se foi isso que
pensaste, estás certo.
Então
vamos à derriça. Porém, antes da “paulada”, faço questão em colocar uma frase
que, não sendo da minha autoria estou em consonância com o seu criador; “A
vida só pode ser compreendida, olhando para trás; mas só pode ser vivida,
olhando para frente.” (Soren Kierkgaard).
Sabes
muito bem o que é um cabouqueiro, não sabes?! No nosso tempo eram pessoas
simples, honestas e trabalhadoras, a quem a sorte na vida pouco protegia; uns
pobres diabos, que que agarravam a essa profissão “ingrata” para manterem a sua prole, por norma grande
(ainda não havia televisão), à custa de muita sudação e sacrifício, sob o risco
de ficarem soterrados por baixo dos escombros das suas demolições. Desditosos!
Agora,
com as mudanças na climatologia política social, essa profissão já é tida como
pertença de alguns fraldiqueiros da nossa aristocracia falhada - que certamente
não deixa de não ser bem remunerada – apostados em roer-nos parte dos capítulos
da nossa longa e interessante História.
“Atão
num”
queres “ber”, que apareceu recentemente um “cabouqueiro”
a cobrear por entre cascalho da nossa sabuja política, apostado em desmantelar
o Padrão
dos Descobrimentos, para usar o entulho no calcetamento de
alguns buracos nas ruas de Lisboa?!
Claro
que este, não é um inofensivo cabouqueiro como os de antigamente. Este lapardas,
está a “caboucar” para arruinar o nosso arcaico passado histórico. Na sua
enfezada mente de “cabouqueiro”, alguns símbolos representativos do grande
historial do Mundo Português, são para derrubar. Um dos que está na mira da sua
picareta, é o Padrão dos Descobrimentos.
Achas
que este morcão, que devia ter sido despachado dentro de um preservativo no
Pinhal de Leiria, tem algum lampejo de patriotismo? Saberá aquele zagorro, que
o passado, a língua, o território e a bandeira, são as particularidades que
atestam a identidade de um povo? Terá ele o conceito do que é defender um
símbolo nacional? Eu acredito que não.
Mas
olha; ainda por cima adjectivou aquele monumento com um vocábulo que assenta
bem a ele próprio (ao cabouqueiro); “mamarracho”.
Sim,
porque ele é um mamarracho,
na erudição e na maneira de pensar. É caso para dizer: pobre Pátria, que tão
ingrato filho abrolhou! – Mas sei que não é único, infelizmente. Existem p’raí
uns quantos.
Os
monumentos, independentemente do que representam de bom ou de mau, fazem parte
da nossa história – já não digo da dele. Uma nação – ou filho dela - que renega
o passado histórico, é filho/a bastardo/a do Mundo. Um apátrida. Um
cosmopolita. Logo, todo o cidadão que enverede por essa via, merece ser
considerado como tal; um filho bastardo de qualquer nação.
Se
assim entendo, cidadania consiste em ter o direito a ter direitos, não excluindo,
contudo, o cumprimento de deveres. No meu entender, não deveria ser permitido a
este “cabouqueiro”,
a este “mamarracho”, ocupar a posição que ocupa, nem ter
direito aos direitos concedidos, como a qualquer cidadão, que se preze de o
ser.
Vejo
na expressão desse “mamarracho” politiqueiro,
um atentado soez às proezas dos portugueses no Mundo e um ultraje a Luís
de Camões, que “cantou”:
As armas e os barões
assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
E agora “canto” eu:
Se da sepultura, lograsse levantar-se Camões,
Apesar de ter só um ôlho, mas ser macho,
Com coragem, nobreza e justas razões,
Degolaria a insolência do “Mamarracho”;
Por ter ofendido a nossa bravura,
Remetendo-a para o caixote do lixo,
Não tem direito a qualquer benzedura,
Um “Cabouqueiro”, da laia deste “Bicho”.
(A.
Figueiredo)
Olha ZÉ, como podes observar, eu também “canto o peito
ilustre Lusitano”; para que todos os “cabouqueiros” e “mamarrachos” entendam o orgulho e a profundidade do sentimento pátrio, que
representa tudo o que se relaciona com a História, boa ou má de um povo. Neste
caso, o Povo Português.
Prezado Amigo. Se sentes as coisas como eu, sai do teu
enclausurado silêncio e bota cá p’ra fora, bolas! Desempanturra!
Com adeus, escoltado por um grande
abraço de consideração, despeço-me de ti.
Até qualquer dia, Zé.
António Figueiredo e Silva
Coimbra, 04/03/2021
http://antoniofsilva.blogspot.com/
Nota:
Faço por não
usar o AO90
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