“O trabalho poupa-nos de três grandes males:
tédio, vício e necessidade”.
(Voltaire)
O
TÉDIO
РОЖДЕНИЕ
THE
BOREDOM
Die
Langeweile
Como
a quarentena imposta por causa do COVID-19 me quer obrigar abrir as portas ao
tédio, eu, que sou obstinadamente resiliente e portador de robusto espírito de
contradição, vou tentar dar umas “ladradelas” sobre este estado de espírito que
está a afectar muita gente, posso dizer, com alguma razão de causa.
O tédio é um estado de espírito que toma
conta de nós, se formos inertes e não tivermos capacidade inventiva, para artilhar
algo que o possa desmoronar. Se nos
deixarmos subjugar por ele, ficamos corroídos física e emocionalmente, e a
nossa tranquilidade é arruinada com concepções fantasmagóricas de situações
turvas e dramáticas, que envolvem o nosso pensamento de tudo o que pode haver
de pior, para nos molestar a quietude de mental. No meu entender, o tédio é uma
espécie de letargia aparente; interiormente podemos sentir-nos buliçosos e irrequietos;
enquanto que a apatia, no seu estado puro, não tem estes sintomas; apenas nos
coloca o pensamento em suspensão, condição essa, que pode ser observada pela
expressão aparentemente meditativa donde sai um olhar fixo, direcionado ao
nada.
Existem sempre formas de contornarmos essa
falta de estímulo, que na maior parte das circunstâncias é consequente de
grandes interregnos transitórios de clausura ou de comportamentos, cuja rotina
é a repetição frequente dos mesmos acontecimentos.
Ele
definha o estado de espírito, incapacita e melancoliza as pessoas que permitem
que tédio, delas se apodere.
Para mitigar o tédio, até o solilóquio
pode ser uma importante arma; não virá nenhum mal ao mundo, por termos sido
encontrados a falar sozinhos; é preferível “barafustarmos” com nós próprios, p’ra
matar o tédio, do que embrulharmo-nos no silêncio apático e doentio, como “tranquilos”
padecentes, à espera que o carrasco do aborrecimento assome e nos ceife o
descanso espiritual.
Há sempre qualquer coisa a fazer para vencer
esta realidade desagradável, que em determinados momentos de maior debilidade emotiva,
nos quer assaltar; cantar sem vontade, falar sem apetecer, limpar o pó sem apetência
p’ra isso, pintar – quem não tiver propensão para a arte que se distraia a
remover o sarro dos cascos e a caiá-los -, ler ou escrever, chatear o vizinho (agora
não porque está encafuado nos seu “casulo” na esperança de que a crise
desapareça), dar uns passadas a assobiar toscamente pelo espaço habitacional; quando
é casal, resmungarem entre si (é normal nestas situações), fazer renda e, se a “família”
for numerosa, dar banho e “Katar” as pulgas aos cães, escovar o pelagem aos
felinos ou colocar paparoca aos periquitos.
Tudo o que for possível fazer para nos
arrancar do marasmo entediante, é trabalho útil; para nós, que ficamos
aliviados, e para os outros, que deixamos de importunar – em certas situações, sem
razão.
Não sou psiquiatra, psicólogo, nem tão
pouco psicanalista, contudo, estou convicto de que o aborrecimento contínuo pode
levar à depressão. O tédio permite que o martelo dos problemas – muitos sem
fundamento - bata na bigorna da nossa emoção, quando ela está numa situação de
fragilidade.
Há que esquivarmo-nos da psicose do
aborrecimento; com o acumular do tempo ela derrota-nos, e afecta sempre quem
nos circunda.
Evitem-no. Façam como eu, que estou p’raqui
“ladrar” sem saber p’ra quem, e se me faço entender. Mas sei o porquê; p’ra
matar o tédio.
“Ladrei”. Quando não estiver satisfeito,
se se tornar fastidioso pela sua acção repetitiva, alternarei com uns “uivos”
pelo meio.
ESTEJAM DE QUARENTENA COM INABALÁVEL COM ENERGIA.
DESTRUAM O TÉDIO, OU ELE “DESTRUIR-VOS-Á”.
António Figueiredo e Silva
Coimbra, 22/03/2020
Nota:
Sou contra o AO90
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