Sou
rico? Sim! Rico de talento e quem
for pobre de espírito, só lamento.
(Lucas
Ferreira - poeta)
SORRIR
PARA A OBJECTIVA, OU…
Retratar
a paparoca colorida – que irá comer, ou não!? – exposta em grandes travessas ou
em pratos de loiça rústica – agora é fino – é característica protocolar que
condimenta a maneira de ser de quase todo o mundo, porém, esta obliquidade tem
salientado carrego na projecção da real essência dos portugueses que, com
sorrisos constrangidos, biquinhos e línguas de fora, dedos polegar e indicador
na posição de OK, fazem questão em manifestar o ridículo da sua grandeza
pessoal e paz individual, numa tentativa frustrada de esconderem o lado mais
sombrio da realidade, que consiste num cadinho dilemas onde as meditações
negativas se acumulam e proliferam, com
grandes possibilidades do seu encéfalo atingir o colapso neuronal.
Ainda não percebi bem porquê, mas
fotografam tudo: a comida do cão ou do gato, quando estes já são parte
integrante do aglomerado familiar - que o PAN não me censure - pratos de couves
com bacalhau, sapateira de viveiro mais ameijoas importadas do Vietname,
sardinhas vindas de Espanha – cá não se podem pescar – com pimentos, panelas
com papas de sarrabulho, fatias de presunto com broa, os tachos, o penico, os
tomates, o burro do vizinho - a rivalizar com a sua fisionomia etc.
Muitas vezes em casa, outras em “grandes”
restaurantes ou em pequenas tascas, ou ainda sentados no capim onde há minutos
alguns cães mijaram, acocorados à beira de um caminho junto ao carimbo
português devidamente empalhado com cinco litros de “tinta”; tudo serve para o
efeito pretendido, que se resume apenas em sorrir para uma objectiva
optométrica, a esboçar um sorriso muitas vezes ridículo, que inicia numa orelha
e finaliza na outra, atravessando vezes sem fim uma fisionomia aparvalhada e
demente, sem que o seu dono disso dê conta, dando a impressão de aquele rosto
manifesta uma felicidade extrema, onde a tristeza não tem guarida e os
dificuldades não existem.
Toda esta montagem para quê? Para espelhar
nas redes sociais uma imagem toldada por um desmedido astigmatismo, em que a
maior parte da felicidade esboçada certamente que não corresponde à realidade, não
passando, portanto, de uma mera falácia, que até a elas próprias engana – olha
como fiquei bonita/o – esperando obter muitos “gostos”.
É engraçado, não é?
É a exibição mais ténue de mostrar para
toda agente que a vida é bela quando por vezes o não é, que tudo corre bem,
mesmo quando o vento não está a favor, que os sapatos da existência não apertam
os calos, quando eles até dificultam o andar e atanazam o canastro e o ânimo.
Quanta melancolia e quanta amargura não se
empilham por trás daqueles sorrisos forçados que fielmente as objetivas captam?
Quantas frustrações não saltitam no espírito daqueles rostos, com os músculos
faciais forçados, os cínicos cúmplices do sorriso amarelo, “convidados”
compulsivamente a colaborar naquelas encenações momentâneas para a “lápide” da memória
futura?
Aparentemente está tudo bem, tudo fixe,
tudo numa boa!
Não sei, mas por tudo o que tenho
constatado, toda a gente vive bem e está em paz consigo própria cá neste nosso cantinho,
o alvalade onde somos enganados, espoliados, e sodomizados sob a anestesia do
autoritarismo regulamentar, cuja equidade é falseada aos nossos olhos. É uma
alegria!
Se assim é, não têm nada de que se
queixarem, ou então, o que exteriorizam é uma aldrabice pura.
Sorria sempre, nunca revele o que motivou
a depressão e continue a sorrir.
António Figueiredo e Silva
Coimbra, 01/01/2019
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