quinta-feira, 2 de agosto de 2018

ESPANTALHOS


O povo é um pêndulo instável, que
balança entre a esquerda e a direita,
 movido pela corda da diversão.
(A. Figueiredo)


ESPANTALHOS

Ia eu, absorto nas minhas maquinações, em silencioso monólogo, prestes a atravessar a imponente entrada do Município de Oliveira de Azeméis, quando inesperadamente olho de relance e soltam-se-me uns vocábulos…
- Bom dia, Sr. Presid… - enganei-me!?
Afinal não era o Presidente da Edilidade, porém um espantalho plantado à porta, do lado direito de quem entra, quedo, muito sério, como um soldado “preso” na guarita, à espreita de quando passa o o macambúzio do sargento. Engraçado!
O que devia ter-me provocado aquela “alucinação” nos meus neurónios encefálicos, deve ter sido a circunstância de que, no meu tempo de miúdo, os espantalhos serem artisticamente confeccionados com roupas já velhas, rôtas ou muito poidas, - actualmente tendência das pessoas de “bom gosto” - com um chapéu de verdadeiro feltro, mas quase todo triturado pelos ratos, ou uma carapuça de lã desusada, que estava arrumada a um canto, onde as malditas traças faziam a sua criação. O resto era palha de trigo, centeio, aveia ou cevada.  
Contudo, ao analisá-lo, verifiquei que este espantalho era muito diferente, dos que então havia conhecido; talvez daí fosse decorrente a minha ilusão. Vestia um fato cinzento-azulado, novo, bem passado, com as calças vincadas, e, ao que parece, por pessoa com mestria na arte de engomar – hoje usa-se muito, não só para a roupa, mas também na política, para atingir altos estatutos -, com os cabelos ainda não totalmente brancos, mas acinzentados, com o braço esquerdo subido numa atitude de interiorizada matutação e os “dedos” de palha a cofiar uma barbita “espantalhadamente” desenhada, destinada a assombrar a passarada.
Por ali andei, e à medida que ia indagando sobre o acontecimento, mais espantalhos se me deparavam por todos os cantos e esquinas, e nas mais variadas formas e feitios. Engraçado – pensei.
Acabei por concluir que era a “Festa dos Espantalhos” do Município de Oliveira de Azeméis – subentenda-se promovido - que considero um acontecimento de grande envergadura para fomento do comércio local e para distracção dos munícipes, enquanto as coisas rolam cada vez mais na mesma.
 Ri. Que mais poderia fazer? Achei tanta piada, que resolvi escrever esta meia dúzia de disparates para distrair o pagode ou irritar os nele mandam, e…
Porque gosto de espantalhos.

António Figueiredo e Silva
Coimbra, 02/08/2018
www.antoniofsilva.blogspot.com


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