quinta-feira, 5 de outubro de 2017

O VETUSTO MOINHO E LAGAR DE AZEITE

O VETUSTO MOINHO E LAGAR DE AZEITE
(Relíquias de Vila Verde de Oura)

Eis o que o que resta actualmente, após o “assassinato” do Moinho e Lagar de Azeite, único em Vila Verde; restos adulterados de uma obra que atestava a tecnologia artesanal que fazia parte da maneira de viver da comunidade habitacional daquela terra, são agora um amontoado híbrido, de pedras, tijolos e cimento, a adulterar a antiga beleza daquele campo verdejante humedecido pela correnteza apressada das águas do rio Oura.
Sinto que bastantes pessoas não dão valor algum às velharias “fossilizadas” erguidas com alguma rudeza, mas com aguçado engenho, num passado distante, que obstinadamente teimaram em sobreviver até hoje; mas é através delas que podemos valorizar um determinado percurso da evolução da técnica e do sacrifício porque poderiam ter passado os seus obreiros movidos a côdeas, a trabalhar de sol-a-sol, desde o romper da alva até ao toque das Santíssimas Trindades, compassadamente badalado por um habilidoso que, puxando uma já desgastada corda de sisal, fazia retinir no campanário da aldeia, a sineta, com três vezes três toques, intervalados entre si com a precisão do relógio biológico do puxador.
Era aquele o sinal qua anunciava o fim de mais um dia de causticante labuta.
Ao que me contaram pessoas que já não se encontram entre os vivos, naquele lagar se faziam óptimas “migas de azeite” (tiborna); consistiam em pão de centeio ou de milho torrado nas brasas do bagaço da azeitona moída, que depois de espremido e massacrado com água a ferver, seguidamente era aproveitado para incandescer a fornalha destinada ebulir a água duma caldeira que era usada para obtenção do ouro da oliveira - claro que, os mais abastados não se furtavam a assar um bocado de bacalhau; tudo isso era copiosamente regado com azeite e saboreado com uma boa pinga e dois dedos de prosa à mistura.
Alguns mais alambazados, com medo de que o mundo acabasse naquele dia até ficavam, como é usual nos dizeres da terra, com azeite a escorrer pelo papo (queixos) abaixo, que, quando galhofeiramente avisados, limpavam às costas das mãos e estas às calças, ou ao puído casaco que os defendia do frio. 
Era uma festa, uma fartura! Naquele tempo, por se contentarem com pouco, tinham muito; hoje, que não se contentam com muito, não têm nada.
Ainda cheguei a conhecer este moinho/lagar, não em laboração, porém intacto, do qual tenho um desenho a tinta-da-china elaborado por mim em 1985, onde se pode ver como era no tempo em que a sua virgindade não havia sido adulterada.

O MOINHO/LAGAR DE AZEITE DE VILA VERDE DE OURA! UMA RELÍQUIA.

António Figueiredo e Silva
Coimbra, 01/10/2017
www.antoniofsilva.blogspot.com



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