A POLÍTICA É UM EXERCÍCIO
NOBRE (?...)
(Actualisadíssima)
Breve entrada:
Em
tempos passados, alguém procurou incutir no Zé Pacóvio, que a política é
“um exercício nobre”; esta frase tem sido, até aos dias de hoje, o Cavalo
de Tróia de muitos aselhas bafejados pela negligência, mas protegidos entre si
por uma beatífica e adulativa coesão, em que o apadrinhamento e a vassalagem
emergentes para a manutenção dos seus poleiros, são notórias.
Antes
de continuar, quero aqui referir que sou apartidário, anti-sectário,
anti-fanático, conservando contudo, acentuada ortodoxia na manutenção dos
valores que devem reger o comportamento da comunidade em que estamos inseridos,
sabendo no entanto, quando vou meter o papel na greta, em quem me apraz votar.
Vezes sem fim,
existe sempre alguém que tenta, com grande teimosia, martelar na cabeça do “Zé
Pacóvio”, que “a política é um exercício
nobre”.
Para que não
surjam quaisquer dúvidas, acho por bem esclarecer a quem costuma dizê-lo, que
as coisas não se passam tão linearmente como podem supor, não deixando contudo
de manifestar o meu apreço pela coragem, que com ou sem convicção, alguns têm
na afirmação de tais palavras, por vezes em tom belicoso, no decorrer de uma
qualquer liça politiqueira.
Agora vamos ao
que interessa: “a política é um
exercício nobre”. Bem… “Se bem me lembro”, como dizia Vitorino Nemésio nas
suas intervenções, para ser franco, nunca me tinha apercebido de tal nobreza
nessa profissão, mas, matutando bem no assunto, há pessoas que até são capazes de
estarem certas nas suas afirmações; no entanto, a ver vamos, como diz o cego.
Se os
propagadores destas palavras, pretendem aludir a virtude nobreza à política em
si, e à amplitude que o seu significado abrange, a política é nobre; o que não
tem sido nobre infelizmente é o seu exercício. E assim, o que dizem não
constitui mais do que uma empertigada pedrada que ricocheteia no campo
absolutista da razão, por razões endógenas que naturalmente povoam a
privacidade do seu estado de espírito.
Pelas
infinitas cavaladas que se têm verificado, injustiças que se têm cometido e
incoerências que se têm presenciado, o exercício da política não tem sido
distinto não tem sido excelente, não tem sido notável, não tem sido ilustre nem
tem revelado superioridade moral, nem tão pouco assentado na dignidade de
carácter.
Então onde se
esconderá a nobreza que alguns tão pragmaticamente apregoam? É muito natural
que essas palavras, talvez irreflectidamente vertidas, não passem de um
condimento auto-promocional, para valorizar uma actividade (exercício) que tem
andado pelas ruas da amargura, não só cá, como em todo o mundo. O manuseamento da política!
Não quero com
isto dizer que não existam pessoas com capacidade para equacionar e usar os
valores nobres da política, com a religiosa convicção de que trabalham para o
bem comum, aplicando-os com grande magnanimidade e rectidão. Porém, só me é
dado avaliar as pessoas pelas suas reacções e não pelo pensam. Mas com estes
predicados, pelo que tenho presenciado, há poucas criaturas, não subsistindo
portanto, razão para afirmações de que “a
política é um exercício nobre”. Seria nobre sim, se a política não fosse
invadida pela politiquice e o lavar de roupa suja, que mancha a cristalinidade
das suas características, que são inegavelmente notáveis.
O exercício político
para ser nobre, deve assentar nos valores da moral e da ética, o que
lamentavelmente não tem acontecido.
Para se
fabricar um político, toma-se um indivíduo, independentemente do seu saber
qualificativo ou sexo; não importa que seja deficiente no seu pensar, coxo,
zarolho, marreco, maneta ou bexigoso; não interessa também se é filho do pai ou
filho da mãe ou se é filho de ninguém. A condição essencial é saber papaguear
bem e zelar pelos seus interesses e dos seus sectários, prometendo à calcetada
arraia-miúda uns “figos”, em troca de uns votos. Enfia-se-lhe uma camisa ou um
vestido, que mesmo comprados em qualquer feira ou até mesmo nos ciganos, também
serve, uma gravata ou um lencinho polimérico a imitar pura seda, adquirido nos
saldos das nossas lojas mais rascas, enfia-lhe uma cassete na cabeça e manda-se
para a frente de “combate”. Ele depois se encarregará de ganhar para uma melhor
fatiota, porque a bem ou a mal o povo pagará o resto. Aí o temos!...Um político
politiqueiro na sua verdadeira nata, tendo por missão arranjar um pacto de
estabilidade entre Deus e o Diabo ao mesmo tempo; por isso ele vai ter que ser
sacana e manhoso, fingindo-se dócil e humilde. Assim sendo, na política devia,
mas não integra “um exercício nobre”,
na medida em que para pactuar com o bem e com o mal, torna-se imprescindível
colmatar a dualidade de critérios em acirrado antagonismo e para isso é
necessário a demolição das causas nobres que a política devia conter.
É um meio pelo
qual muitas pessoas tentam branquear aquilo que já é negro de nascença. Até
agora, salvo raras excepções, só tem servido para encher o papo a abutres, em
dano dos racional, ou materialmente mais carenciados.
Com que então “a política é um exercício nobre”?!... Por enquanto apenas me resta chalacear,
porque não paga imposto – até ver.
O que é nobre é
isento de interesses pessoais, transparente e rigoroso.
Atestar a nobreza do exercício político, é
como comer uma fatia de abóbora porqueira, e, arrotando indiscretamente, dizer
com fingido optimismo que a melancia era boa.
A política foi
uma invenção do ser humano com a finalidade de ser realmente exercida com
nobreza, excelência e moral; porém, destas virtudes apenas emanam as intenções,
porque os objectivos para os quais foi inventada tomaram outras direcções menos
virtuosas.
Só para
exemplificar: a fome, a guerra, a desestabilização, e a injustiça, são
indubitavelmente consequências do uso defeituoso da política.
Como tal, onde
estará a nobreza no seu exercício?
É que “POLÍTICA” é uma coisa e o seu “EXERCÍCIO”
é outra.
António
Figueiredo e Silva
Coimbra,
15/02/2003
www.antoniofigueiredo.pt.vu
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