ANIMAIS (O CÃO)
Recolha um cão de rua, dê-lhe de comer
e ele não o morderá; eis a
diferença
entre o cão e o homem.
(Mark Twain)
ANIMAIS
(O cão)

Diversas vezes
o cão é abandonado, desprezado, mal tratado e, perdoando, continua a lamber as
botas ao seu dono ou a quem ele pense que o é. Tenho pensado vezes sem conta,
que talvez o homem sinta inveja da maneira de ser do cão, e por isso o despreze
tanto. Se quando Deus criou o homem lhe tivesse incutido o senso do cão, de
certeza que o mundo se apresentaria de maneira diferente!... Talvez mais humano
em vez de mais canino. E digo canino, porque se na boca do homem fossem
semeados dentes de cão, andaríamos todos mordidos ou até mesmo mutilados. Ele
só não é mais cão porque não pode; a sua construção física não dá para isso,
mas a psicológica é suficiente para muito mais.
O homem não
respeita o seu semelhante, os seus chefes, as suas leis, na forma de direitos e
deveres; é pior do que o cão, porque até nem a ele mesmo se respeita. O cão
sabe qual a sua posição na hierarquia da matilha, conhece o seu semelhante,
respeita-o e obedece-lhe e até faz o favor de gostar do seu dono, quando o tem,
independentemente da fartura ou da miséria em que ele esteja metido.
Muito admiro
este animal. O cão mostra ao homem que tem mais de humano, do que homem tem de
cão.
O homem, numa
posição mesmo que baixa, é traiçoeiro e procura não lamber as botas a ninguém;
antes pelo contrário, tenta morder-lhas. E se as lambe já não é homem, mas um
ser servil, que o situa num universo muito abaixo do cão.
Com o seu
olhar dócil e o rabo a meia haste, abanando a cauda e saltando ou com o seu
olhar esbugalhado, orelhas erectas, rabo no ar, pêlo crispado e dentes à vista
ou ainda caminhando de cabeça baixa com o rabo entre as pernas, podemos contar que
naquele momento ele está presente sem fingimentos, pronto para o que der e
vier, de bem ou de mal.
Nada disto se
passa com o homem!? Quantas vezes ele vem de “rabo” entre as pernas, submisso,
solícito, simpático, com cara de sofredor e traz uma “faca no bolso”!... Quantas
vezes ele sorri até fazer doer os músculos das orelhas – quem tem só orelhas –
e no seu interior é só veneno, insensatez, inveja e velhaquice?
O cão não é
assim; faz tudo para agradar ao homem, se bem que este não faça nada para
agradar ao cão, nem ao menos imitar a sua maneira de ser.
Se eu
mandasse faria uma inversão de dons. Poria o homem a ladrar e o cão a falar.
Acreditem que ele tinha muito para dizer, deixando o homem despido de toda a
sua imbecilidade.
Muito mais
teria para dizer sobre as virtudes desse nobre animal, mas penso correr o risco
de ser mordido pelo homem. Mesmo assim, quero aqui prestar a minha sincera
homenagem ao cão, sem distinção de raças, porque ele conhece melhor o homem do
que o homem conhece o cão.
Só por isto,
o cão merece.
António
Figueiredo e Silva
Coimbra,
03/08/2003
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