ILUSÕES (?) (Anseios de mentes humanistas)
Uma
sociedade só é democrática quando ninguém
for
tão rico que possa comprar alguém e ninguém
seja
tão pobre que tenha a que se vender a alguém.
(Jean-Jacques
Rousseau)
ILUSÕES
(?)
(Anseios
de mentes humanistas)
Foi
meu companheiro na Força Aérea Portuguesa; comungámos de muitas dificuldades
durante a crise então instalada, decorrente da guerra em Moçambique e da
desorganização que campeava nas forças armadas, que nessa altura era um
verdadeiro cozido-á-portuguesa, até serem criadas as condições mais ou menos
sustentáveis para a nossa “pequena” estadia no norte daquela terra situada no
fim do Mundo.
Conversávamos
bastante nos momentos de lazer à sombra da bananeira”, em que ele, mercê do seu
pensamento filosófico – que ainda hoje mantém – com um onirismo bem enraizado e
indestrutível, atirava cá para fora, como actualmente faz, em palavras marginadas
de beatífica convicção, realidades cuja concretização, à sua nascença, se afundam
no espaço da impossibilidade absoluta.
Interiorizou no centro do seu campo
cognitivo, que o mundo tem tendência a mudar para melhor, atribuindo esta
mutação a uma consciencialização global a nível dos governantes e dos grandes
poderosos, onde o dinheiro vai deixar de existir e será retomado o sistema de
permuta e entreajuda em todas as necessidades, acabando deste modo com a
ambição materialista, a causa primária de toda a desordem instalada na
Comunidade Humana Global.
- O dinheiro não é preciso – diz.
Lá vai a minha interrogação enfática e
concisa, lógica, e pertinente:
- Então para que queres tu, o dinheiro?
- Tenho de o ter, porque mo pedem, se
não, não teria necessidade dele para nada!?
Argumenta ainda, que o Homem erra por
ignorância congénita, porém, à medida que se vai apercebendo dos erros que faz,
vai naturalmente clivando a sua maneira de ser, de ver as coisas de maneira
diferente e certamente não irá cair nos mesmos erros, uma vez que conclui que
estes são funestos.
Bem, eu já não penso da mesma maneira, mas
reconheço a nobreza de espírito deste meu amigo, que deixa transparecer um
manancial de boas intenções, das quais está repleto mundo, não sendo porém,
estas usadas na prática.
Por esta linha de ideias, está
severamente convencido de que, já não no tempo da sua (nossa) vivência, porém
num futuro próximo, essa consciencialização colectiva – intitula ele - emergirá
do espírito selvagem que até agora pisoteia a sociedade e dará origem a um
paraíso na terra, em que todos possamos viver em tranquilidade e exultação.
Argumenta ele, que o Mundo em que
vivemos, em si, já é um paraíso, se bem que nós não tenhamos disso perfeito entendimento,
resultando daí a incapacidade de podermos usufruir dessas dádivas que muito
naturalmente estão ao nosso alcance.
Qual é o motivo que pode legitimar
porque é que no meio de tanta abundância, existe tanta miséria? Inquire. Somente
porque é do interesse dos poderosos e dos governantes, aleitar a fome e a
miséria, resultando daqui a necessidade de sobrevivência – argumenta; daí,
brotam os monstros da desgraça: a instabilidade social e a guerra.
Com uma consciencialização purificada
isto daria para todos e sobrava para muitos. A boa vivência está garantida por
natureza; o que busca cada ser humano é viver bem e em paz; por isso o que tem promovido
a guerra? Como podemos ver, unicamente a parte material o tem legitimado. É a
ambição pelo dinheiro que tem abafado a possibilidade da harmonia paradisíaca
entre a Comunidade Humana.
Esta ambição materialista tem partido
sempre dos grandes e dos poderosos, que têm sido um mau exemplo para os seres “rastejantes”
que eles comandam com pulso de ferro, apesar de muitos deles se abrigarem sob
uma democracia e igualdade de direito fraudulentas, onde a paridade não existe,
- arremata.
Ele pensa assim.
Eu, o que hei-de cogitar?
Oxalá que seja realizado este presságio,
que eu, com acentuado cepticismo questiono!?
No entanto, não deixo de não dar razão à
reflexão de *Jean-Jacques Rousseau, “É na
desproporção entre os nossos desejos e as nossas faculdades que consiste a
nossa miséria. Um ser sensível cujas faculdades igualassem os desejos, seria um
ser absolutamente feliz”, e, naturalmente, às concepções do meu amigo Alberto Baptista.
António Figueiredo e Silva
Coimbra, 13/04/2017
*Nasceu em Geneve, Suíça, em 1712.
Foi um importante filósofo, teórico
político, escritor e
compositor autodidacta; é considerado um
dos principais
filósofos do iluminismo.
O estado da Natureza, concepção sua,
está descrito no
seu livro, Discurso sobre a Origem e os Fundamentos
da
Desigualdade entre os Homens.
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