O MATA-BORRÃO
O MATA-BORRÃO
Lembram-se?...
Aquele papel reles e absorvente servia para secar a caligrafia evitando que ela
esborratasse quando a escrita era feita com uma pena rasca? Que chupava também
as nódoas (borrões) de tinta, quando esta, pelo seu excesso no aparo era
coagida pela força da gravidade e caía no papel com a tendência sacana em
borrar a alvura e a estética do documento? A esse papel chamava-se papel
mata-borrão (alguns intitulavam de papel mata-murrão). Com o funeral da
tecnologia obsoleta esse problema acabou, mas continua a existir sobre outras
formas e não tem os mesmos fins que os simples e desusados mata-borrões do
antigamente, que muitos não conheceram mas certamente já têm ouvido falar.
Se olhardes à
vossa volta numa apreciação calma e concisa, ireis encontrar muitas “nódoas” e “borrões”
para as quais o antigo papel mata-borrão, ainda que hoje existisse, não teria
qualquer préstimo.
O “mata-borrão”
moderno, é um “mata-borrão” de colarinho branco e sapato engraxado, não
exceptuando também que os há de calças de ganga e botas cheias de porcaria
muito semelhante com a que normalmente lhes sai boca, segregada pela opacidade
das suas ideias, mas não absorvem as nódoas erradicando-as cerce; apanham-nas em
vez de as chuparem, protegem-nas e serve-se delas para, de cambalacho, chupar
os outros ou vergá-los à sua vil maneira de ser.
Como se pode
ver, os tempos mudaram mas o “mata-borrão” tem-nos acompanhado sempre numa
perseguição cerrada, invariavelmente acompanhado pelas nódoas negras, não para
nos facilitar a vida mas para no-la infernizar.
Sou a favor de
que quando se apanha um mata-borrão, com ou com ou sem borrão unido, é
destruí-lo e mandá-lo para a reciclagem, tantas vezes quantas forem necessárias,
até que saia transformado numa utilidade pública mais prestimosa que não a de nos
sacanear; ou então promover o seu desaparecimento por completo.
Uma maneira
eficaz de destruir completamente um “mata-borrão” com ou sem nódoas, ou reciclá-lo,
por muito avantajada que seja a sua estrutura, é isolá-lo, ignorando-o em
absoluto. É enquistá-lo socialmente, causando-lhe uma espécie de fibrose no seu ego e ele, de uma maneira ou de outra,
acabará por capitular. Se o fizermos, ele degradar-se-á por si próprio, caindo
de maduro. O isolamento silencioso e pleno gerado por toda uma comunidade
dar-lhe-á poucas hipóteses de sobreviver. O desprezo silente como punição é de
todas as armas a mais poderosa de que tenho conhecimento. Convenientemente
aplicada ao “mata-borrão”, ele muda a maneira de ser e torna-se dócil e sociável,
ainda que a contra gosto, ou então enlouquece e suicida-se.
O ignorar-se
um elemento por todos os restantes em forte coesão, possui um poder de
destruição incalculável. Por vezes torna-se difícil, mas o silêncio danifica
muito as qualidades do “mata-borrão”.
Por isso, para
higienização do meio em que vivemos, é de primordial importância “destruir”
esse comedor ou protector de borrões, que no final não passa de um verdadeiro
limpa sarranhos, para que a salubridade
se possa embrenhar na nossa vivência, em franca, aberta e fraterna comunidade.
António
Figueiredo e Silva
Coimbra,
17/07/2007
ou:
www.antoniofigueiredo. pt.vu
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