"ELES COMEM TUDO E NÃO DEIXAM NADA"
A democracia, muitas vezes significa o
poder
nas mãos de uma maioria incompetente.
(George Bernard Shaw)
“ELES COMEM TUDO E NÃO DEIXAM NADA”
(Estrofe d’um verso de Zeca Afonso)
Nasci uns dias antes da assinatura do armistício que ultimava a Segunda Guerra Mundial, que não deixou de não provocar uma crise económica globalizada que se estendeu por alguns anos. Ainda me recordo das senhas para o bacalhau e para açúcar.
Outros
tempos, outras razões. outras linhas de moral. Enfim, outros valores!
Vivi nesse tempo, sofri nesse mesmo tempo, mas
não deixei de desfrutar de algum prazer ao ter vivido nesse período. Aprendi
muito com os sacrifícios impostos pela conjuntura da altura, não obstante a
minha desbarbada maturidade e imponderada reflexão. Era novato! Apesar de ser
um monte de argamassa ainda por moldar, a minha capacidade de observação já
estava geneticamente traçada; porém, ainda não polida. No entanto, a sua robustez
e moldagem, com as quais ainda hoje me sinto confortável, tenho de reconhecer serem
consequência das complexidades que atravessei. Ou abrolhava a vivacidade ou
capitulava. Optei pela primeira, ainda que algo “defeituosa” - reconheço.
Se
me fosse perguntado, “gostarias de voltar a viver naquele tempo?” é certo que
responderia que sim, evidenciando a minha faixa etária naquela altura, em que a
loucura e o sonho me iam alimentando a emoção; mas, é provável que respondesse que
não; porque as lições foram duras e baseavam-se estritamente, no exemplo e na
prática desses mesmos padrões.
E
se me observassem; “Se fosse no outro tempo, não divulgarias este escrito”;
claro que não. Agora posso fazê-lo, mas nada adianto, porque “os cães ladram
e a caravana continua” - permitem-me “cantar”, mas não dançam ao compasso da música. Faço-o, não para endireitar o que está e continuará torto, mas mais
como um desafogo que me comprime o íntimo.
Naquele
tempo, havia ordem, progresso, educação, (não descorando alguns arredios que com
umas arrochadas iam ao sítio), civilidade, justiça e alfabetização com credível
recheio.
Depois
da acirrada luta para manter a minha cabeça erguida e de ter passado por dois
estágios de políticas diferentes, concluí que as coisas não foram como as
pintam; a minha provecta idade, isso acusa. Enquanto que os “jovens” relatam a narrativa
que lhes é contada, não por historiadores, mas por tendenciosos cuntadores
d‘stórias, eu falo com factos vividos e sentidos, e não contaminado por
palavras engendradas e fermentadas por meros contistas de algibeira, para se
fazerem sobressair nesta sociedade demente, em que a sua maioria é propensa acreditar
em tudo, desde que a falácia vá ao encontro dos seus desejos e ambições.
A
meu ver, a plenitude da trova, para a época em questão, foi bem concebida e implicitamente
censurava actos que não devim ter sido praticados. Por tal motivo, é meu dever louvar
esse poeta (e músico), pela corajosa transmissão do seu pensamento, na altura,
e pela estrofe que dele recolhi, a qual considero ter sido uma verdadeira
profecia, que finalmente hoje se converteu em realidade.
Abençoado
Zec’Afonso, e que a tua alma repouse na serenidade celestial (se ela existir), em
eterno descanso.
Esta
tua estrofe, (não me refiro à globalidade do poema), encaixou com perfeição na
altura devida; porém, é, sem dúvida, igualmente apropriada ao presente, pelas propriedades
que agrega.
Foi
um poema arrancado do fundo do teu espírito sublime e emotivo, destinado a uma
época determinada; porém, a estrofe por mim plagiada, tem sentido sim, todavia,
noutro período subsequente, que é o actual.
Grato
por isso.
Naquele
tempo, é verdade que não se comia de tudo, mas comia-se tudo; “quando a
larica aperta, não há ruim pão”.
Que
havia pobreza, é verdade. Contudo, estarei equivocado se disser que nos tempos
que correm, e com esta governação, é bem maior? Penso que não. E mais; a
pobreza, que infelizmente tem crescido a olhos vistos, tem sido abusivamente
usada, como um prestável contributo ou muleta de suporte, nas campanhas eleitorais.
Prosseguindo:
Hoje é bem pior: comem de tudo (aqueles
que podem), mas, no fim, também não comem “nada” – apenas falsificações naturalizadas.
Agora é que, “eles
comem tudo e não deixam nada”.
Por causa de toda a forretice a que na
altura ditatorialmente fomos sujeitos, após a morte do ditador, ainda sobraram umas
“barrazitas” de ouro, e uns valentes alqueires de prestígio no Mundo – sou
crente de que não estou a mentir – que foram completamente exterminados com o
“abrilar” da neo-democracia,
que, em toda a “resplandecência” e euforia, assomou à (des)governação deste
território, e acabou por provocar um verdadeiro abalo sísmico, que destruiu
todos esses valores materiais, éticos e os “satélites” a eles cativos. Tem
sido um descalabro, em toda a grandeza que o vocábulo possa abranger.
Não tenho dúvidas e ainda cá me encontro “vivinho
da silva”, para dizê-lo.
Portugal é hoje um lacaio da Europa. Como qualquer
lacaio, executa o que lhe é determinado sem um cisco de vontade própria; não tem
estructura económica sólida – anda sempre de bordão e chapéu na mão na pendichice
(transmontanismo=esmolar); ora chega a troika, ora vem a bazuca
(mas que bazucada para o povo saldar); a justiça anda rastejante e perdeu
credibilidade (só tem força para a arraia miúda); os membros da governação
estão protegidos pelo privilégio da imunidade em podem fazer a “cagadas” e
“burricadas” que entenderem, que nada lhes sucede; não têm necessidade de
criar galinhas, patos ou perus, (como no tempo do “ditador”); porque, além da
remuneração que auferem, acrescem as “alcavalas” - mais do que o
suficiente para se darem a esse “desprestigiante” trabalho de “caca de galiáncios”, (veja-se
Deputados - Estatuto Remuneratório para 2022).
Não vale a pena acrescentar mais ao que
sobejamente todos conhecem, uma vez que já me sinto esfalfado. Mas, só mais um minuto
para dar por ultimada a sessão edificada no alvalade do meu espírito descontente.
Se temos os cofres vazios e andamos a
esmolar, só posso concluir que o considerável aforro legado pelo ditador, foi perdulariamente
dissipado, abusivamente desviado (p’ra num dezer extorquido), ou sofregamente
ingerido – não por vampiros, mas por abutres oportunistas e sem consciência.
Agora sim, depois deste preâmbulo de malhanço,
já concordo com Zec’Afonso.
Ao acreditar cegamente no populismo, e com a chave do nosso voto, “se lhes franqueia as
portas” à entrada…
Eles comem tudo, eles comem tudo,
Eles comem tudo e não deixam nada”.
Certinho, direitinho.
António Figueiredo e Silva
http://antoniofsilva.blogspot.com/
Nota:
Faço por não
usar o AO90
Consultar:
Do Estatuto dos Deputados
(1) Nos termos da Lei n.º 4/85, de 9 de abril de 1985
(1), até outubro de 2005, os Deputados tinham direito a uma subvenção mensal
vitalícia a partir do momento em que cessavam as funções de Deputado, desde que
tivessem desempenhado essas funções pelo menos durante doze anos (o equivalente
a três legislaturas) (2). Este regime foi revogado pela Lei n.º 52 A/2005, de
10 de outubro de 2005, contudo, ainda se encontra em vigor para os Deputados
que, no momento da sua revogação, já tinham conquistado o direito de beneficiar
de tal regime (ou seja, já exerciam funções há doze anos ou mais).
Tem muita razão. Aquilo que se passa hoje é tão lamentável, que só acredita quem tem vivido esta situação. Parabéns por ter coragem de dizer aquilo que muitos pensam, mas não se atrevem a dizer (apesar da democracia que temos ).
ResponderEliminarGrato pela sua anotação.
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