"APURAR"

 

 Penso, logo existo.

(René Descartes)

 

Há quem exista e não pense;

logo, é acéfalo.

(A. Figueiredo e Silva)

 

“APURAR”

(Aos portugueses em “apuros”)

 


Entre o possível dos “apuramentos” e a realidade das complicações, não vou deixar passar em branco a oportunidade de lavrar algo sobre o vocábulo APURAR, que com espirituosa “eloquência” e abusiva repetição, tem vindo a ser empregue como muleta amenizadora de dúvidas, quando “certezas não existem” (ou se presume tal), mas que não tem conduzido a lado nenhum. Os apuramentos apenas ficam na caçoila do molho expectação marinar, até que algum tempo passe, e todo acidifique, e seja arquivado “ad aeternum” por expiração temporal – na maioria dos casos, intencional.

É um vocábulo, que, pela sua repetência excessiva mete repugnância ao mais inerte defunto; revitaliza e assanha a dolência do mais pacato cidadão, pondo-lhe os nervos à flor da pele, porque, do APURAR, apenas existe o verbo e nada mais para além disso.

Por qualquer coisa, vai-se apurar, vai ser apurado, vamos apurar, estão a apurar, está em apuramento; e assim consecutivamente, até à morte certa do verbo APURAR.

O que é de APURAR, raramente ou nunca é apurado; os que sob apuramento, por “legítimas” e requintadas artimanhas, falseiam os procedimentos do APURAR, mediante a criação dos mais diversos modelos de incertezas, para conduzir o tempo processual ao cadafalso do “in dubeo pro reo”, onde vai ser guilhotinado sob o gume afiado da lâmina do ARQUIVE-SE POR PRESCRIÇÃO; enquanto o povo geme, espremido pelas tarraxas do apenas “promissor” e longínquo APURAR.

Mas este tão vulgarizado APURAR, não é aplicado a qualquer reles pilha-galinhas. Não! Para a “escumalha” não existe o direito, - mesmo num estado de direito – ao uso do verbo APURAR. À “ralé”, é-lhe aplicada a coima (nome amoroso para multa), não se obstam de penhoram-lhe o calhambeque, ou até o penico, ou vai mesmo dentro, sem apelo nem agravo, como prémio de consolação – isto está a ficar cada vez mais bonito!

Tenho vindo a notar que, ao APURAR, só têm direito as pessoas mais incompetentes, mais trapaceiras e mais irresponsáveis deste país; as mais “favorecidas” (dubiamente), no mundo pedregoso – e manhoso - dos estratagemas, onde reluz o filão diamantífero que as conduz à opulência indevida e a uma liberdade quase absoluta, à custa do alheio.

Contudo, se o verbo APURAR for “pronunciado com todas as sílabas”, (há peritos nisso, desde que não lhes decapitem o justo lugar), toda essa abastança e toda essa liberdade, podem converter-se em ruína e em dependência, apoucadas pelo manto da clausura e da vergonha.

Para que tal suceda, nunca a verdade deve ser emudecida para que a realidade não possa ser encoberta; porque, se o APURAR não acontece como é devido, quem fica em apuros somos nós, OS PORTUGUESES; que uma podre oligarquia manda, comanda e “apura”, sem nada APURAR.

 

António Figueiredo e Silva

Coimbra, 02/07/2021

http://antoniofsilva.blogspot.com/

Nota:

Faço por não usar o AO90.

  

 

 

 

Comentários

  1. Muito bem escrito Sr. Figueiredo, mas devia enviá-lo ao Dr. Marcelo Rebelo de Sousa que, desde que foi eleito a primeira vez, passa o tempo a dizer que " SE VAI APURAR " sobre os incidentes com que este Governo e seus muchachos frequentemente nos brindam.

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    1. Desculpe só agora responder. Sei que é tarde, mas penso que ainda irá a tempo. è provável que ele já a tenha lido.

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