DETA (Linhas Aéreas de Moçambique)
(Linhas
Aéreas de Moçambique)
Tenho a certeza de que, quando os “filmes de longa metragem” gravados num passado já distante começam a projectar a sua virtualidade na tela real do nosso pensamento, temos que legitimar que é sinónimo de velhice. Mesmo admitindo que é impossível, alimentamos a ânsia de querer agarrar o passado com ambas as mãos, movidas pelas derradeiras e débeis forças que, a muito custo, ainda subsistem e nos estimulam a réstia de esperança que ainda em nós flameja.
Hoje
deu-me na pachorra escrever algo sobre a empresa onde dei por bem empregue os
anos que por lá passei a “conquistar” os meios materiais que na altura
permitiram a minha subsistência.
Vou
divagar sobre DETA (Direcção de Exploração dos Transportes Aéreos), Linhas
Aéreas de Moçambique, onde obtive o meu primeiro emprego após ter saído da
Força Aérea Portuguesa, a minha primeira e grande escola, que ainda hoje
recordo com saudade, porque foi lá que aprendi o “abecedário aeronáutico e
alguma escrita” que me permitiram singrar nesta empresa, até ter que zarpar
para um país vizinho.
Até
hoje, nunca mais pus os pés naquela terra, naquele aeroporto, naqueles hangares;
nunca mais toquei em nenhuma daquelas aeronaves, às quais a minha cabeça tanta
mioleira dedicou, para no fim, servir de repasto ao olvido.
Um
esquecimento compulsivo do qual ainda tenho marcas remanescentes, que, em noites
de maior vigília, povoam o meu onirismo e fazem germinar muitas lembranças em
forma de peroladas gotas de emoção.
Aprendi
e apreendi muito naquela empresa; aproveitei bem os cursos e recursos com que ela
me subsidiou, mas sempre pugnei para que as chefias nunca se houvessem
arrependido pelas oportunidades que, passo a passo, me iam concedendo. Fiz tudo
por isso e consegui-o. Por onde passei, não deixei má imagem da DETA
Foi naquela companhia, que, com vinte e nove
anos já detinha as Licenças Aeronáuticas, sob o nº 129, (“toucinho” que muitos
queriam poder rilhar, ficando-lhes apenas o apetite temperado pela fantasia,
com sabor a inaptidão – suponho), “licenciado” em Fokker
F27 Friendship, e Boeing 737, a máquina voadora mais recente e mais sofisticada
da DETA; para quem conhece, sabe que foi uma obra prima dedicada à aviação comercial.
Foi
subsidiado pela DETA que me desloquei a Salisbury (Rodésia), a fim de
frequentar um treino no, na altura velho, Boeing 720; foi a DETA que me enviou
à TAP, para conseguir o Curso do Boeing 707, que consegui, sem deixar mal
vistas as chefias que em mim haviam confiado, como o Eng. Rebelo e o Eng.
Carmelo (óptimas pessoas).
A
provar a sua confiança, optaram por me “expedir” novamente à TAP, com o
objectivo de adquirir o Curso do Boeing 747 - Jumbo, que à época eu considerei
a “besta” aeronáutica para transporte de passageiros. Com muito estudo e
algumas dores de cabeça, mais uma vez consegui obter a qualificação, que não
ousou encavacar aqueles que em mim depositaram a seu crédito. Se ainda
existirem, quero que saibam que nunca os arrumei a um canto, nas poeirentas
prateleiras do esquecimento.
Como
tantos outros, baptizado com “pomposo” título de Técnico de Manutenção de
Aviões, por ali fui ambulando entre os hangares e a gare do aeroporto Gago
Coutinho; ora executando inspeccões às aeronaves da companhia, ora prestando
assistência ao avião Boeing 720, da Air Rodesia ou aos aviões da TAP, nos quais
era cursado.
Foi a DETA que me forneceu um Passaporte
Oficial para todos os países com quem Portugal mantinha relações diplomáticas.
Que eu saiba, de todos os Técnicos de Manutenção, era eu o único que possuía
essa “benesse”; isto porque, por vezes surgia a necessidade de verificação e ajustamento
de determinados componentes dos reactores que equipavam os Boeings 737, cujos instrumentos
de análise e ferramentas específicas, para verificação e consequentes ajustes
pretendidos, nós não possuíamos; tornando-se por isso, imperativo, recorrer aos
“laboratórios” da South African Airways – e não havia tempo para desperdiçar
com as entidades policiais ou aduaneiras.
A título de apêndice: uma das vezes que
para lá nos deslocámos – ainda me recordo bem – no regresso, eram cerca das 22:45
da noite, o aeroporto estava a “dormir” sob a meiguice do calor tropical! A
torre de controlo, aos mosquitos e a iluminação da pista de aterragem extinta.
Os pilotos tiveram que andar por ali às voltas até que, o já falecido Adelino
Martins, (na altura Chefe de Inpecções), que mora ali pertinho, deu conta de que
o avião andava por ali a “pastar” na “cálida” atmosfera africana e de imediato alertou
todos os sectores necessários para a aterragem – parece galga, mas foi verdade.
Continuando:
Já estava a “voar alto” quando, passado algum
tempo e após infernal burburinho, a determinada altura ouvi, através de uma
emissão da estação Rádio Club de Moçambique, as palavras que iriam modificar o
meu azimute e na vida (e na vida de
muitos mais), e rumar para o país vizinho, África do Sul, para safar a minha
pele e a dos meus, após o pouco “glorioso” o sete de Setembro – o tempo assim o
provou; palavras essas, que ainda trovejam dentro de mim aficam em alimentar
uma aura de revolta, mas, ao mesmo tempo, fazem abrolhar a saudade! *“Galo,
galo, amanheceu”; galo, galo, amanheceu”.
Por
aquela nação, (também agora economicamente enfraquecida e insegura, continuei
cerca de dois anos integrado no sector da aeronáutica, onde ao fim de um ano
fui promovido a assistente chefe de equipa.
Passado
mais um ano, por causa da promulgação de uma nova lei, “cheirou-me” que algo de
bom não iria acontecer (como se pode actualmente se constatar), regressei ao
meu país e jurei que nunca mais sairia de Portugal.
Apesar
de algumas oportunidades que me surgiram devido à minha ficha curricular, abdiquei
de todas. Só valoriza a cidadania, quem já viveu noutro país.
Mas, movido por inveterado vício aeronáutico e
com o bichinho a morder-me o miolo, sem saber da poda, enveredei por ser “aviador”
de balcão, sem carecer de qualquer cursozeco preliminar; eu como
comissário e a minha esposa como assistente de bordo. Fácil!? Em vez de repetirmos
a cerimoniosa e protocolar pergunta, “chá, café ou laranjada”, acrescentávamos
ainda, “uma cerveja, um bolinho ou uma bifana?!” Tomei de trespasse um
café. O café mais velho de Coimbra (tem a minha idade; setenta e sete verões e
ainda está a bulir como eu), do qual guardo memórias de tempos passados nesta
bela cidade de Coimbra, terra abençoada, onde formei as minhas filhas e que
considero a minha segunda terra de “nascença”.
Apesar
de tudo, fiquei sempre muito grato à DETA - Linhas
aéreas de Moçambique, porque considero que foi aquela
companhia que realmente me abriu as portas para o meu ganha-pão e me
proporcionou as várias defesas de tese para o meu “Mestrado” em técnica da
aviação, para a qual é indispensável, dedicação, estudo, senso de responsabilidade
e perícia neuronal, para resolução dos problemas no imediato.
Seja
qual for a espacialidade de um técnico (que se preze) em máquinas voadoras, ele
continua a estudar pela vida fora; a evolução da tecnologia a isso o obriga.
Não se faz um mecânico de aviação, com um treino de trinta horas, para depois continuar
a “voar eternamente” na mesma atonia. Não. Diariamente se depara com problemas diferenciados
que ele tem de resolver com a maior brevidade e segurança; é coagido a instruir-se
para quebrar a barreira da ignorância que nunca o largará, por esta se mover a
par com o avanço tecnológico. Se assim não for, não irá a lado algum. Mas é
lindo, gratificante, e, acima de tudo, viciante! É um mundo à parte, onde a surpresa
está sempre presente.
Ainda
hoje estou grato a alguns elementos da chefia daquela época (aqueles que
faleceram, paz a sua alma!) por terem depositado em mim, a sua confiança.
António
Figueiredo e Silva
Coimbra,
22/04/2021
https://antoniofsilva.blogspot.com/2021/04/deta-linhas-aereas-de-mocambique.html
Ou
http://antoniofsilva.blogspot.com/
Nota:
Faço
por não usar o AO90
*Para
aqueles que desconhecem,
foram as palavras emitidas pela FRELIMO, através
da rádio,
como
grito de vitória, anunciando a capitulação de Portugal.
Caro amigo, gosto dos seus artigos e pifo-os para o meu blog. Eu anda por Moambique e Rodhesia por essa altura. Abraço
ResponderEliminarhttp://aquitailandia.blogspot.com
Não há problema; esteja à vontade.
EliminarEu também estive na Rodhesia há muitos anos!
Fui lá adquirir um treino em avião velhinho; Boeing 720.
Abraço.