O ENFERMO E A AFABILIDADE


As doenças do espírito são mais funestas
e mais numerosas do que as do corpo.
(Cícero)

Algumas mentes, mal “licenciadas”, não possuem
o sentimento necessário para o compreenderem.
(Digo eu)

O ENFERMO E A AFABILIDADE

Sinto que há razões sobejamente evidentes para derramar meia dúzia de palavras sobre a matéria em questão, por tudo o que tenho observado e por diversas pessoas asseverado, sobre a nobreza do atendimento ao doente; pese embora o “benefício da dúvida”, penso que é meu dever “sentenciar” sobre esta virtude – e dever -, que considero fazer parte da terapia, se não física, emocional, daquele que sofre do corpo ou da alma, porque uma afecta a outra.
A afabilidade e delicadeza utilizadas na recepção e posterior terapêutica de um maleitoso têm um peso preponderante na sua cura, se esta for possível, ou funcionam como um lenitivo para a sua última expiração se por ironia esta sobrevier.
No meio de tanta gente boa que tenho relacionado, com capacidade científica e moral para cumprir as suas funções – ainda bem que parece ser a maior percentagem - e com puro altruísmo, usando esta dualidade de critérios, por vezes também podemos “desfrutar” do infortúnio de nos depararmos com alguns carneiros estúpidos, sem nível profissional, e porventura nem pessoal, para lidarem com o indispensável civismo e sentido ético, no cabal cumprimento das funções que lhes foram confiadas.
Uns porque dormiram mal ou têm os calos a doer, recebem os “desgraçados” com observável desinteresse, esquecendo que eles se encontram num patamar de completa e aflitiva fragilidade; outros olham por cima do ombro com um semblante rasca adornado de embrutecida sobranceria, acentuando deste modo a dor de quem já a sente, na alma e no corpo. São as “pequeninas” bestas que proliferam do nos alfobres da nossa urbanidade aonde o “estrume” da formação não chegou. São realidades que ocorrem em algumas instituições credenciadas para a recepção de enfermos; transitórios, para consulta rotineira à procura da terapia para as mazelas que os agrilhoam, ou em aflitiva situação de urgência, da qual nunca saberão se a porta de saída será a mesma pela qual entraram.
Nestas condições, onde é suposto na recepção haver delicadeza e condescendência, aparece sempre alguém por aqueles sítios, que sofre de espondilose egocêntrica e julga-se superior aos débeis, recebendo-os com frígida indiferença, onde apenas emergem inquirições e/ou orientações de manifesta frieza; naturalmente para economizar saliva ou um natural sorriso, atributos que são simplesmente de borla para todo ser humano e isentos de IVA – mas não isentos da boa vontade de alguns profissionais de saúde, como é manifesto, em alguns tinhosos cívicamente mal formados.
Os que por princípio usam e abusam destes comportamentos campesinos e fora da ética, clarificam a sua quimerizada egolatria com se estivessem acima dos de mais, numa atitude de “eu é que sei tudo, porque estudei”. Manifestam-no com estilizadas, mas tolas exibições de passerelle, para rematarem com a desprezível ostentação de uma figura parva, onde a humildade e a civilidade nunca aportaram; granjeando dessa forma, as críticas mais avinagradas, sublevadas e depreciativas, mesmo daqueles, que por falta de oportunidade ou outros motivos na vida, ficaram encurraladas sua modesta simplicidade – aparentemente -, que esses espiritualmente mal formados titulam de saloiice, circunstância que não tem nada a ver com intelecção. Que fique bem entendido.
Esta crónica é mesmo dirigida a essas criaturas rascas, cujos condimentos do seu asqueroso temperamento, são a insolência e a prepotência, que utilizam como propriedades oxigenadoras do seu autoconvencimento falhado.
Ainda assim, fico na expectativa de que esta censura, dada a sua cínica “leveza”, provoque nelas o efeito daquilo a que vulgarmente se chama de, meter o indicador na vertical, encostado ao nariz, e… chíuuu! Corrijam-se.
Para todos os que elegeram como seu trabalho lidar com doentes, sejam quais forem as mazelas que os minam, está bem clara, não está?
Espero que esta serradela tenha contribuído para possível lapidação no modo de ser dessas criaturas que tratam enfermos. Seria bom.
Mais acrescento: quem não nasce com a melodia na alma, nunca será bom músico.
Mesmo acorrentado ao risco de que as minhas “doutrinas” possam não ser bem acolhidas, fico aliviado por ter feito a minha parte, concorrendo para a sua difícil lapidagem.
Sei que sou teimoso, mas…
“Burro velho não tem emenda”.

António Figueiredo e Silva
Coimbra, 26/04/2016

Nota:
Não escrevo segundo o AO90.

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