Criatura
que labuta apenas pelo dinheiro, não
deve sentir satisfação naquilo que faz e pode
mirar-se ao espelho como um escravo
assalariado
por conta própria.
(A.
Figueiredo)
ONDE
GUARDAR O DINHEIRO!?
Devido
à salivação dos amigos-da-onça que com uma polida e chorada ladainha se batem a
um empréstimo que nunca fazem intenções de pagar e ao aguçado faro da ladroagem,
é preferível não o possuir, se ambicionamos ter descanso.
É uma grande chatice ser-se depositário
de um pé-de-meia arrecadado em casa – e não só - seja qual for a sua valia.
Há “clientes” para todas as quantias,
que vão desde uns míseros cêntimos até aos milhões de ”paus”; é deplorável, mas
existe que não acredite na existência dos seguidores de Arsène Lupin no século
XXI e com doentia forretice arrecadam-no nos sítios mais excêntricos que
possamos imaginar; desde buracos feitos em paredes velhas, até cavidades em
betão-armado, passando por autoclismos e candeeiros; enrolado dentro de latas
que dizem café ou em pacotes de farinha Tapioca; por baixo de uma carcomido
soalho ou dentro de um cofre-forte – pensavam; dentro de uma velha pipa de
vinho vazia ou num pneu sobressalente já careca; aqui há uns quarenta anos conheci
uma senhora que o metia dentro bolsos que tinha por dentro da saia e todas as
noites, antes de se deitar, deleitava-se contá-lo – não é mentira; era a sua “prece”
preferida.
Com gravata ou de calças rôtas, de cara
destapada ou coberta por um capuz, com intuições homicidas ou só com apetite
materialista, esses sectários existem. O que pode restar a quem tem algum?
Enfiá-lo no bolso, é um problema; tê-lo em
casa, é um problemazão; emprestá-lo, é um caso bicudo; mantê-lo no banco, com
todas as tramóias que têm havido, não é lá muito fiável, todavia será mais seguro;
isto é, até que a instituição entre em falência deixando o desgraçado sem
tostão e aborrecido porque ficou na merda, mas descansado porque tem
oportunidade conhecer que, dos parcos amigos que lhe restam, um deles é um cão
rafeiro, e sabe que, a partir daquele momento ficou isento de assaltos, ficando
apenas no seu encalço a AT (Autoridade Tributária) se ele tiver algum barraco
para o abrigar e ouvir em mudo solilóquio as suas lamentações, ou alguma leira
para cultivar uns nabos e uns tomates, fontes da sua sobrevivência – é preciso
tê-los para suportar a implacável tarraxa regulamentar que não se compadece com
o azar de ninguém.
É certo que o pilim a todos faz falta,
porém na medida certa das suas necessidades. Quando já não cabe num bolsito
jamais se anda sem um incómodo aperto no esfíncter, a ser perseguido pela
insónia e pelo olhar enviesado dos amigos do alheio.
Mesmo assim, se as migalhas desaparecem juntamente
com o cotão dos bolsos pela destreza de mãos alheias sem darmos por isso, é
certo e sabido que vamos ser implacavelmente invadidos por uma aterradora caganeira nos que faz sacudir o corpo e
doer a alma como se fosse o Dilúvio Universal Bíblico.
Se bem que não desconheça a sua influência na autoridade
social, seria melhor não o termos; assim podíamos guardá-lo onde nos apetecesse,
seguros de que ninguém passa cartão a tesos.
Que tal a ideia?
António Figueiredo e Silva
Coimbra, 12/06/2017
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